Ministério da liturgia
67. A liturgia ocupa, na ação evangelizadora da Igreja, um lugar central. Conforme o Concílio Vaticano II, ela é “ocume para o qual tende a ação da Igreja e, ao mesmotempo, a fonte de onde emana toda a sua força”.137Nela, o discípulo realiza o mais íntimo encontro como seu Senhor e, dela, recebe a motivação e a forçamáximas para a sua missão na Igreja e no mundo.68. Em sentido estrito, a liturgia é a celebração do MistérioPascal da morte e ressurreição de Cristo – e de toda ahistória da salvação. Nessa celebração, os que sofrem emorrem, unidos a Cristo e a seu Corpo, que é a Igreja,participam da vitória pascal sobre o mal e as forçasda morte. Ela é ação ritual, que se realiza em sinaise palavras, é santificação do homem e glorificaçãode Deus. A liturgia é celebrada pela comunidade dosbatizados – ministros ordenados e leigos – reunida emtorno de seu sumo sacerdote Jesus Cristo. A celebraçãolitúrgica implica necessariamente um compromissocom a transformação da realidade em vista do crescimentodo Reino de Deus.69. Por ser a comunidade reunida no Espírito Santo, sujeitoda celebração, todos os seus membros têm o direitoe o dever de participar da ação litúrgica, externa einternamente, de maneira ativa, consciente, plena e137 SC, n. 10.61frutuosa,138 para assim levar a obra salvífica do seu Senhora efeito em si, na Igreja e no mundo. Os ministrosordenados e leigos têm uma função especial de serviçona assembléia litúrgica, e toda ela, como comunidadeeclesial de discípulos, está como missionária a serviçodo mundo.70. Para que seja possível tal liturgia autêntica, seus agentes,isto é, todos os batizados, de modo especial osministros ordenados e leigos, devem ser formados “naestrada de uma catequese de caráter mistagógico, queleve os fiéis a penetrarem cada vez mais nos mistériosque são celebrados”.139 Isso supõe que cada celebraçãoseja devidamente preparada e avaliada.71. Os sacramentos são sinais da comunhão com Deus, emCristo, pelo Espírito Santo, que marcam com sua graçamomentos fortes da vida. Pelo Batismo, mergulhandonas águas da morte e da ressurreição,140 a Igreja acolheas pessoas que, na fé, aderem a Cristo e as inserena comunidade cristã. Pela Confirmação, o cristão éimbuído do Espírito do Senhor e seu santo modo deoperar, para viver de forma madura o compromissode discípulo missionário. Pela Eucaristia, sacrifício ebanquete de ação de graças, a Igreja celebra o memorialda morte e ressurreição de Cristo, perfeita ofertaao Pai, alimentando-se do Corpo entregue e do Sangue138 Cf. SC, n. 14.139 Bento XVI. SCa, n. 64.140 Cf. Rm 6,4-11.62derramado do Senhor, em vista do fortalecimento dacomunhão e da missão de todos os seus membros.Pela Penitência-Reconciliação, a Igreja celebra oamor misericordioso do Pai que acolhe e perdoa ospecadores que buscam a conversão e fazem penitência.Pela Unção dos Enfermos, a Igreja celebra a Páscoade Jesus que se une ao sofrimento dos doentes e idosos,oferecendo-lhes a graça do conforto e da curae o perdão. Pelo sacramento da Ordem, o Espíritoconstitui os ministérios ordenados: bispos, presbíterose diáconos; estão a serviço do sacerdócio comum dosfiéis, instituído em favor dos homens e da comunidadeda Igreja.141 Pelo sacramento do Matrimônio, a Igrejacelebra “o amor de Deus pela humanidade e a entregade Cristo por sua esposa, a Igreja”.14272. O domingo é a celebração do Mistério Pascal. É, pois,o principal dia de festa. É o dia em que a família deDeus se reúne para “escutar a Palavra e repartir o Pãoconsagrado, recordar a ressurreição do Senhor na esperançade ver o dia sem ocaso, quando a humanidadeinteira repousar diante do Pai”.143 Como nos lembraJoão Paulo II, é o dia do Senhor, dia de Cristo, dia daIgreja, dia do Homem e dia dos Dias. Por causa disso,é importante promover a pastoral do domingo144141 Cf. CIC, nn. 1539-1553; DA, nn. 186-208.142 DA, n. 433.143 Missal Romano: Prefácio dos Domingos do Tempo Comum, IX.144 Cf. João Paulo II. DD.63e dar a ela “prioridade nos programas pastorais”.145Em muitas de nossas comunidades, no meio rurale na periferia das metrópoles, onde não é possível acelebração regular e assídua da Eucaristia dominical,devemos valorizar a celebração da Palavra, prepararos ministros da Palavra e oferecer-lhes subsídiosde qualidade, pois essas celebrações são o alimentoordinário da vida cristã e missionária de um grandenúmero de nossas comunidades146 que se reúnem para aCelebração Dominical da Palavra, “a qual faz presenteo Mistério Pascal no amor que congrega (1Jo 3,14),na Palavra acolhida (Jo 5,24) e na oração comunitária(Mt 18,20)”.147 Nas comunidades, onde for possível,distribua-se a Comunhão Eucarística, na celebraçãoda Palavra, especialmente aos domingos, segundo asnormas em vigor. Nossas dioceses ou prelazias farãode tudo para garantir, inclusive com a ajuda de padresde outras dioceses, o ritmo seguro das celebraçõeseucarísticas para todas as comunidades, sinal essencialde sua identidade católica.73. O ano litúrgico “revela todo o mistério de Cristo nodecorrer do ano, desde a encarnação e nascimento atéà Ascensão, ao Pentecostes e à expectativa da feliz esperançada vinda do Senhor”.148 Ele, assim, nos propõe145 DA, n. 252.146 Estima-se em 70% o número de comunidades que celebram a Palavra deDeus.147 DA, n. 253.148 SC 102.64um caminho espiritual, ou seja, a vivência da graçaprópria de cada aspecto do mistério de Cristo presentee operante nas diversas festas e nos diversos temposlitúrgicos.149 Em síntese, através do ano litúrgico, osfiéis fazem a experiência de se configurarem ao seuSenhor e dele aprenderem a viver seus sentimentos.150O ano litúrgico não apenas recorda as ações de JesusCristo, nem somente renova a lembrança de açõespassadas, mas celebra com força sacramental e especialeficácia, alimentando assim a vida cristã. Por isso, oano litúrgico, como itinerário sacramental, torna-se umcaminho pedagógico-espiritual nos ritmos do tempo.Ao longo do ano, sejam assumidas as festas de devoçãopopular, visto que, nas expressões religiosas populares,há uma modalidade profundamente inculturadade manifestar a fé,151 imprescindível ponto de partidapara uma fé madura e fecunda,152 “precioso tesouro daIgreja Católica na América Latina”.15374. Na piedade popular, lugar de encontro com JesusCristo, o povo também encontra maneiras simplesde expressar e viver sua fé e o compromisso missionário.154 A digna celebração dos sacramentais, comobênçãos e exéquias, vem ao encontro da alma do povoe oportuniza a celebração do Mistério Pascal.149 Cf. Paulo VI. NUALC, n. 1.150 Cf. Fl 2,5.151 Cf. DA, n. 258.152 Cf. DA, n. 262.153 Bento XVI. DA: Discurso Inaugural, n. 1.154 Cf. DA, n. 261.6575. Como oração do Povo de Deus, verdadeira ação litúrgica,a Liturgia das Horas (Ofício Divino) é excelenteescola e referência fundamental para nossa oraçãoindividual. É uma oração não apenas dos ministrosordenados e dos religiosos, mas também de todos osfiéis leigos, que são convidados a celebrá-la, individualou comunitariamente, em especial os jovens dos nossosgrupos juvenis. Incentivem-se igualmente outrasformas de oração comunitária da Igreja, por exemplo,Ofícios Breves adaptados, Celebrações da Palavra deDeus, Horas Santas, Ladainhas, Ângelus, Via-Sacrae Rosário.76. A música litúrgica é parte integrante e significativa daação ritual. Ela tem a especial capacidade de atingir oscorações e, como rito, grande eficácia pedagógica paralevá-los a penetrar no mistério celebrado. Para isso, elaprecisa estar intimamente vinculada ao rito, ou seja, aomomento celebrativo e ao tempo litúrgico. Vale dizer,sua função ritual deve estar organicamente inseridano contexto da grande tradição bíblico-litúrgica daIgreja, bem como da vida e da cultura da comunidadecelebrante. É urgente atentar para a qualidade de nossocantar litúrgico, para a importância dos vários ministérioslitúrgico-musicais e, mais que urgente, para aformação e capacitação de todos, especialmente daspessoas e equipes que os exercem. Uma prioridadeestratégica, com certeza, são os centros de formação,tanto das congregações e ordens religiosas, quantodo clero diocesano. É de suma importância aprovei66tar todas as instâncias e oportunidades de formaçãooferecidas, em todo o país, por escolas de liturgia,faculdades, dioceses e regionais da CNBB.77. O espaço litúrgico deve ser funcional, favorecer o encontroentre as pessoas e o encontro com Deus, bemcomo sinal sensível do mistério que ali se celebra. Aarte, a arquitetura, a disposição e a ornamentação dosespaços a serviço da liturgia contribuem para que aIgreja celebre e se manifeste como povo sacerdotal, ministerial,congregado e convocado pelo Senhor Jesus. Abeleza, a dignidade e a simplicidade do espaço devemestar em sintonia com a beleza do Mistério Pascal deCristo.155 É fundamental dar especial atenção à formaçãona área da arte sacra e do espaço litúrgico, tantonos seminários quanto entre os profissionais das artes econstrução civil, para que os espaços correspondam àdimensão simbólica e funcional da liturgia. É urgente,também, nos regionais e nas dioceses a implementaçãodas comissões de espaço litúrgico, compostas, preferencialmente,por especialistas nas diferentes áreas(artistas, arquitetos, engenheiros, liturgistas).78. A inculturação incide sobre a vida comunitária eministerial, sobre a formação e reflexão teológica,e sobre as celebrações litúrgicas. “Os indígenas eafro-americanos são, sobretudo, ‘outros’ diferentesque exigem respeito e reconhecimento.”156 Vivemos155 Cf. Bento XVI. SCa, n. 35.156 DA, n. 89.67hoje “um kairós, tempo para aprofundar o encontroda Igreja com esses setores humanos que reivindicamo reconhecimento pleno de seus direitos individuaise coletivos. Eles devem ser levados em consideraçãona catolicidade com sua cosmovisão, seus valores esuas identidades particulares, para viverem um novoPentecostes eclesial”.157 Na liturgia, portanto, é precisorecuperar as expressões culturais, o ritmo, o cantoe a música, os instrumentos musicais, as vestes, osespaços, os gestos e símbolos das diferentes culturas,sem prejuízo das normas litúrgicas gerais e de acordocom as demais orientações do Magistério da Igreja.Expressões culturais assumidas na liturgia devemapresentar com clareza qual é o acontecimento da féque lhes dá um sentido novo e radical.79. Permanecem como solicitude para a Igreja no Brasil,especialmente a partir da dimensão litúrgica, os seguintesdesafios:a) a promoção de uma liturgia mais popular e inculturada,para que também os pobres e excluídos tenhammais espaço para celebrar, no Mistério Pascal deJesus Cristo, sua vida e sua fé;b) a participação em celebrações ecumênicas, dado ocaráter eclesial da liturgia;c) as celebrações transmitidas pela mídia, de responsabilidadedo bispo local, em seu esforço decriatividade, respeitem as normas litúrgicas;157 DA, n. 91.68d) a ligação da Páscoa de Cristo celebrada na liturgia,com a criação e o cuidado com a conservação danatureza.80. A Pastoral Litúrgica compreende todos os esforços einiciativas para animar a vida litúrgica de uma comunidade,paróquia, diocese, região, levando em conta suarealidade histórica, cultural, social, eclesial, de modoque todos os cristãos possam participar da liturgia deforma ativa, consciente e plena, e colher dela os frutosespirituais. Isso inclui cuidados com a preparação,realização e avaliação das celebrações, com a formaçãodos ministros e do povo e com a organização davida litúrgica nos vários níveis eclesiais. Mais do quenunca, em nossa Igreja no Brasil importa priorizar aorganização e a formação de equipes de liturgia emtodos os níveis, sob a orientação dos bispos, primeirosresponsáveis pela animação litúrgica, e com a participaçãodos presbíteros e agentes de pastoral, de modoa contemplar a celebração, formação, inculturação,articulação, organização, música litúrgica e espaçolitúrgico. Do exercício da colegialidade episcopal e docompromisso com a evangelização do povo brasileiro,nasce a solicitude da organização dos serviços daComissão Episcopal Pastoral para a Liturgia, a fim deanimar e fortalecer a Pastoral Litúrgica nos regionais eincentivar a articulação e o intercâmbio de experiênciase recursos entre eles.69Ministério da caridade81. Se as fontes da vida da Igreja são a Palavra e o Sacramento,o centro da vida cristã158 é a caridade, o amordoação,o amor que vem de Deus mesmo159 e que oapóstolo Paulo aponta como o mais alto dos dons.160“Deus é amor, e quem permanece no amor permaneceem Deus e Deus nele.”161 Nossa resposta é acreditarno amor de Deus. Aqui se encontra o distintivo doscristãos nas palavras do próprio Jesus: “Como euvos amei, assim também vós deveis amar-vos unsaos outros. Nisso conhecerão todos que sois meusdiscípulos: se vos amardes uns aos outros”.162 Aquireside, também, a razão fundamental do crescimentoda Igreja, não por proselitismo, mas por atração, pelotestemunho.163 Podemos ainda também afirmar que“toda a atividade da Igreja é a manifestação de umamor que procura o bem integral do ser humano”,164amor esse que “é o melhor testemunho do Deus emque acreditamos”.165158 Bento XVI. DCE, n. 1.159 Cf. Rm 5,5.160 Cf. 1Cor 12,31.161 1Jo 4,16.162 Cf. Jo 13,34s.163 Cf. DA, n. 159.164 Bento XVI. DCE, n. 19.165 Bento XVI. DCE, n. 31.7082. O amor cristão tem duas faces inseparáveis: faz brotare crescer a comunhão fraterna entre os que acolherama Palavra do Evangelho (a koinonia, a partilha dosbens, a solidariedade) e leva ao serviço dos pobres, aocuidado para com os sofredores, ao socorro de todos osnecessitados, sem discriminação.166 Numa sociedadeque privilegia o lucro e a produtividade como valoressupremos167 e na qual a dignidade da pessoa humananão é valorizada,168 a Igreja deve se fazer presente “nasnovas realidades de exclusão e marginalização em quevivem os grupos mais vulneráveis, onde a vida estámais ameaçada”.169 Daí a necessidade de “ratificar epotencializar a opção preferencial pelos pobres”,170“implícita na fé cristológica naquele Deus que se fezpobre por nós, para nos enriquecer com sua pobreza”171e que deverá “atravessar todas as suas estruturas eprioridades pastorais”,172 manifestando-se “em opçõese gestos concretos”.17383. A globalização fez emergir em nosso país novosrostos pobres, novos excluídos e marginalizados da166 Cf. At 3,1-9; 6,1-6; 9,36-42; 20,33-35 etc.; João Paulo II. NNI, nn. 49-53;DA, n. 161.167 Cf. Bento XVI. DA: Discurso Inaugural, n. 2.168 Cf. DA, n. 387.169 DA, n. 401.170 DA, n. 396.171 Bento XVI. DA: Discurso Inaugural, n. 3.172 DA, n. 396.173 DA, n. 397; Cf. Bento XVI. DCE, nn. 28 e 31.71sociedade: os migrantes; as vítimas da violência; osrefugiados; os seqüestrados; as pessoas portadorasdo vírus HIV; os tóxico-dependentes; os idosos; osmeninos e meninas vítimas da prostituição, da violência,de tráfico de pessoas, de grande número deabortos, do trabalho infantil; as mulheres maltratadas,exploradas sexualmente; as pessoas com necessidadesespeciais; os desempregados; os analfabetos digitais;os encarcerados; os moradores de rua; os indígenas eafro-descendentes; os camponeses sem terra.174 Apesardos enormes recursos econômicos e tecnológicos,persistem a concentração dos bens, a insensibilidadeética e a falta de vontade política para resolver essasituação, pela transformação das próprias estruturassociais e econômicas que reproduzem os processos deexclusão e opressão dos mais fracos. Daí o empenhoda Igreja por uma globalização da solidariedade, dafraternidade.84. Devemos estar atentos, contudo, para não reduzir acaridade ao assistencialismo paternalista. Não somentedevemos partilhar da consciência democrática, queexige o respeito pela dignidade de cada pessoa e apromoção efetiva de seus direitos, mas também verna prática da caridade uma oportunidade de doar edoar-se, de aprender e crescer na troca mútua dos bensmateriais e dons espirituais.174 Cf. DA, n. 402.7285. A caridade cristã deve promover a vida humana emtodas as suas modalidades e defendê-la sempre, baseadano fundamento sólido e inviolável dos direitoshumanos.175 Daí a importância do anúncio de uma antropologiaintegral, de uma visão abrangente da pessoahumana, cujo mistério só se aclara à luz do mistériodo Verbo Encarnado.176 Daí, também, a importância dabioética em nossos dias.177 Do mesmo modo impõe-seo dever de cuidarmos do meio ambiente, tão ameaçadopor interesses econômicos e tecnológicos. A destruiçãodo ecossistema prejudica a todos, sobretudo aosmais pobres, como os indígenas e os camponeses.178Igualmente, brota do amor cristão a defesa das culturasindígenas, de seus territórios e de seus valores,179bem como dos afro-descendentes, com sua memóriacultural, sua identidade étnica e sua luta por uma justacidadania.18086. É importante que a Igreja forme pessoas em níveis dedecisão: empresários, políticos, formadores de opiniãono mundo do trabalho, dirigentes sindicais.181 A opçãopelos pobres exige uma pastoral voltada aos constru-175 Cf. DA, n. 467.176 GS 22.177 Cf. DA, n. 465.178 Cf. DA, n. 473.179 Cf. DA, n. 530.180 Cf. DA, n. 533.181 Cf. DA, n. 492.73tores da sociedade,182 sem esquecer de que os pobres eos marginalizados são também “sujeitos de mudançae de transformação de sua situação”.183 Todos os fiéissão também impulsionados pelo Espírito a participarda vida política, pois a vida cristã não se expressasomente nas virtudes pessoais, mas também nas virtudessociais e políticas.184 Os leigos, devidamenteformados, devem estar presentes na vida pública,185atuando como verdadeiros sujeitos eclesiais e competentesinterlocutores entre a Igreja e a sociedade.186Por outro lado, a participação política, motivada pelafé, pode assumir diferentes formas, desde o interessepelos problemas sociais, participação em conselhos dedireito, até a filiação a partidos e a aceitação de cargoseletivos. Muitos em nossa sociedade, especialmente osmais pobres, sofrem devido aos problemas endêmicosde corrupção nessa área.18787. A vivência da escuta da Palavra, da comunhão fraternae do compromisso com a justiça alimenta e expressa aespiritualidade batismal, que configura o cristão comCristo, o qual por amor entrega sua vida para que todostenham Vida.182 Cf. DA, n. 501.183 DA, n. 394.184 Cf. Bento XVI. DA: Discurso Inaugural, n. 3.185 Cf. DA, n. 508.186 Cf. DA, n. 497. Quanto à participação dos clérigos ou religiosos(as) navida político-partidária, atenha-se às normas do Direito Canônico, 285, §3; 287, § 2.187 Cf. DA, n. 507.74A formação dos discípulos missionários88. Diante da atual sociedade pluralista e secularizada, fazsenecessário reforçar uma “clara e decidida opção pelaformação dos discípulos missionários – os membrosde nossas comunidades”.188 O processo formativo dainiciação cristã não é exclusivo dos não-batizados, masse estende também aos batizados não suficientementeevangelizados,189 que constituem a maioria dos católicosem nosso país. Urge, portanto, uma “identidadecatólica mais pessoal e fundamentada”.19089. O discípulo nasce pelo fascínio do encontro com Cristoe se desenvolve pela força da atração que permanecena experiência de comunhão dos discípulos de Jesus.“A Igreja cresce, não por proselitismo, mas ‘por atração:como Cristo atrai tudo para si com a força de seuamor’. A Igreja atrai quando vive em comunhão, poisos discípulos de Jesus serão reconhecidos se amaremuns aos outros como ele nos amou (cf. Rm 12,4-13;Jo 13,34).”19190. “A própria natureza do cristianismo consiste, portanto,em reconhecer a presença de Jesus Cristo e segui-lo.Essa foi a maravilhosa experiência daqueles primeirosdiscípulos que, encontrando Jesus, ficaram fascinados188 DA, n. 276.189 Cf. DA, n. 288.190 DA, n. 297.191 DA, n. 159.75e cheios de assombro face à excepcionalidade dequem lhes falava, diante da maneira como os tratava,coincidindo com a fome e sede de vida que havia emseus corações. O evangelista João nos deixou porescrito o impacto que a pessoa de Jesus produziu nosprimeiros discípulos que o encontraram, João e André.Tudo começa com uma pergunta: ‘que procuram?’(Jo 1,38). A essa pergunta seguiu um convite a viveruma experiência: ‘Venham e verão’ (Jo 1,39). Essanarração permanecerá na história como síntese únicado método cristão.”19291. Esse itinerário formativo deve partir de “um encontropessoal, cada vez maior, com Jesus Cristo, perfeitoDeus e perfeito homem, experimentado como plenitudeda humanidade”,193 através do anúncio do querigma,do testemunho da comunidade, da participação nos sacramentos,constituindo assim uma autêntica catequesemistagógica.194 O processo implica a possibilidadede uma aprendizagem gradual, devendo a comunidadeeclesial assumir essa iniciação cristã, fato que pedenovas atitudes pastorais por parte dos responsáveis.195Pois, identificar-se com Cristo e com sua missãoconstitui “um caminho longo que requer itineráriosdiversificados, respeitosos dos processos pessoais e192 DA, n. 244.193 DA, n. 289.194 Cf. DA, n. 290.195 Cf. DA, n. 291.76dos ritmos comunitários, contínuos e graduais”.196 Emoutras palavras, “a formação é permanente e dinâmica,de acordo com o desenvolvimento das pessoas e como serviço que são chamadas a prestar, em meio àsexigências da história”.19792. No processo de formação do discípulo missionárioaparecem cinco aspectos fundamentais, diversos “emcada etapa do caminho, mas que se complementamintimamente e se alimentam entre si”.198• o encontro com Jesus Cristo, através do querigma,fio condutor de um processo que culmina na maturidadedo discípulo e “deve renovar-se constantementepelo testemunho pessoal, pelo anúncio do querigmae pela ação missionária da comunidade”;199• a conversão, resposta inicial de quem crê em JesusCristo e busca segui-lo conscientemente;200• o discipulado como amadurecimento constante noconhecimento, amor e seguimento de Jesus Mestre,quando também se aprofunda o mistério de suapessoa, de seu exemplo e de sua doutrina,201 graçasà catequese permanente e à vida sacramental;196 DA, n. 281.197 DA, n. 279.198 DA, n. 278.199 DA, n. 278a.200 Cf. DA, n. 278b.201 Cf. DA, n. 278c.77• a comunhão, pois “não pode existir vida cristã forada comunidade: nas famílias, nas paróquias, nascomunidades de vida consagrada, nas comunidadesde base, nas outras pequenas comunidades emovimentos”,202 tal como acontecia entre os primeiroscristãos; a comunhão na fé, na esperança e noamor deve estender-se também aos irmãos e irmãsde outras tradições cristãs;• a missão, que nasce do impulso de compartilhara própria experiência de salvação com outros, deplenitude e de alegria feita com Jesus Cristo; amissão deve acompanhar todo o processo, emboradiversamente, conforme a própria vocação e o graude amadurecimento humano e cristão de cada um,203tendo Maria como modelo perfeito do discípulomissionário.93. Muito ajudará nesse itinerário formativo que a Igrejareforce quatro eixos em sua pastoral, que aparecemquando se busca esclarecer as razões pelas quais católicosdeixam a Igreja para se unir a outros gruposreligiosos. Geralmente, são por falta de formaçãocatequética adequada e de cunho vivencial.204 Esseseixos são:• a experiência religiosa feita no encontro pessoalcom Jesus Cristo;202 DA, n. 278d.203 Cf. DA, n. 278e.204 Cf. DA, n. 225.78• a vivência comunitária que propicie acolhimentofraterno e valorização pessoal, de forma que cadafiel se sinta visível e eclesialmente incluído naIgreja;• a formação bíblico-doutrinal que proporcionemaior conhecimento da Palavra de Deus e maiorcrescimento espiritual;• o compromisso missionário de toda a comunidade,indo ao encontro dos afastados e não-praticantes.20594. A iniciação cristã, um processo integral, constitui-senuma formação básica destinada a todos os membrosdo povo de Deus, “qualquer que seja a função quedesenvolvem”.206 Além disso, nestes tempos em que arealidade se torna cada vez mais complexa, exigindoconhecimento e atuação especializados, torna-se indispensávelconsiderar o que é específico a cada vocação,a cada ministério e serviço na comunidade eclesial ena sociedade. Ao mesmo tempo em que se forma aidentidade cristã, é preciso investir no conhecimentodas diversas realidades.95. A formação dos diáconos e presbíteros exige umaatenção especial para que respondam aos desafios darealidade atual e contribuam para que toda a Igrejaseja discípula missionária. Oriundos de uma cultura205 Cf. DA, n. 226.206 DA, n. 276.79marcada pela fragmentação, pela preponderância doaspecto individual e pela dificuldade em relação aprojetos comuns e a longo prazo, essas vocações demonstramque o Senhor Jesus, o Bom Pastor, continuaa chamar ao seguimento, cumprindo sua promessa deestar com sua Igreja até o final dos tempos.207 Apresentamtambém à pastoral vocacional e, mais ainda,às equipes formadoras, o desafio de encontraremcaminhos que, acolhendo os que chegam, possamefetivamente prepará-los para estar no mundo, sem,todavia, serem do mundo.208 Da formação permanentedos presbíteros depende em grande parte a necessáriaformação dos fiéis. É indispensável ainda que diáconose presbíteros tenham formação ecumênica adequadae interdisciplinar.96. Uma formação permanente e integral209 possibilitaráaos leigos a descoberta de sua própria vocação e osmotivará para assumirem sua missão. A Igreja particulardeve ter entre suas prioridades esse processoformativo,210 que “não é um privilégio para poucos,mas sim um direito e um dever para todos”,211 comoparte do “projeto orgânico de formação”212 dioce-207 Cf. Mt 28,20.208 Cf. DA, nn. 99c; 192; 314ss; Jo 17,11.14.209 Cf. CNBB. Doc. Missão e ministérios dos cristãos leigos e leigas, nn.175-189. São Paulo, Paulinas, 1999.210 Cf. João Paulo II. CfL, n. 57.211 João Paulo II. CfL, n. 63.212 DA, n. 281.80sana. Requerem-se dos leigos co-responsabilidadena tarefa formativa213 e participação nas equipes deformação.21497. A Igreja conta com a variedade e o dinamismo doscarismas da Vida Consagrada na realização de suamissão evangelizadora. Os religiosos e religiosas, apartir de seus carismas, são convidados a colaboraremcom as Igrejas particulares para formar discípulosmissionários.98. Reafirmamos a importância e mesmo a urgência deinvestir na formação específica dos leigos e leigas215“para darem testemunho de Cristo e dos valores doReino”216 no que diz respeito às grandes questões queafetam o povo brasileiro e, nesta época de globalização,o planeta como um todo. São, por exemplo, questões ligadasà responsabilidade socioeconômica e política,217à ecologia,218 ao diálogo com as diversas culturas,219entre as quais a cultura urbana.220 Em cada um desses213 Cf. DA, n. 202.214 Cf. DA, n. 281.215 Cf. DA, n. 283.216 DA, n. 212.217 Cf. DA, n. 77.218 Cf. DA, n. 66.219 Cf. DA, n. 341.220 Cf. DA, n. 118k.81setores, e em muitos outros,221 o conhecimento especializadoe devidamente nutrido pelo Evangelho, pelaDoutrina Social da Igreja e por uma forte sensibilidadeética, representa hoje a concretização da responsabilidadede todos os leigos e leigas como missionários nomundo através do anúncio de Jesus Cristo e do diálogoe serviço, para a transformação da sociedade.22299. Para que tenhamos um laicato adulto e maduro, sãofundamentais a organização e a articulação dos leigos,de modo especial nos Conselhos Diocesano, Regionale Nacional de Leigos, “porque incentivam a comunhãoe a participação na Igreja e sua presença ativa nomundo”.223 Nessa perspectiva, é necessário fortalecero Conselho Nacional dos Leigos do Brasil (CNLB),nos diferentes âmbitos.224221 O Documento de Aparecida aborda, de maneira geral, o processo formativodos leigos e leigas. Explicita a necessidade da formação em determinadoscampos de atuação, por exemplo: “No âmbito da vida social, econômica,política e cultural” (212); no ecumenismo (cf. 232); com os migrantes(cf. 413); na defesa da vida (cf. 469h); na comunicação (cf. 486 – b e f);na pastoral urbana (cf. 517h e 5l8k); nos novos areópagos e centros dedecisões (cf. 492 e 497); na vida pública (cf. 505 e 506).222 Cf. DA, n. 283.223 Cf. DA, n. 215; SD, n. 98; CNBB. Doc. Missão e ministérios dos cristãosleigos e leigas, n. 191. São Paulo, Paulinas, 1999.224 Cf. CNBB. Doc. Missão e ministérios dos cristãos leigos e leigas, nn. 192e 193. São Paulo, Paulinas, 1999.82A espiritualidade do discípulo missionário100. A missão evangelizadora exige não só estruturas adequadas,mas também que os sujeitos sejam alimentadospor uma espiritualidade missionária conforme aprópria vocação, os dons, os carismas e os ministériosrecebidos do Espírito para a realização do Reino.Técnicas e instrumentos são importantes, mas nãosubstituem a ação do Espírito Santo, que faz arder ocoração do seguidor de Jesus e o coloca no caminhodos irmãos para expressar sua experiência.225 Fazemparte da própria missão evangelizadora a alimentaçãointerior que sustenta a eficácia de seu agir, a fidelidadeao Evangelho e a autenticidade do testemunho.101. A ação evangelizadora e pastoral, como serviço damissão e obediência ao Espírito, exige do evangelizadorcuidar da própria competência, para que, pornegligência, não venha a perder o Evangelho. Exigesábia aplicação dos instrumentos modernos, com critériosevangélicos. “Mas nada substitui a experiênciado Deus vivo, alimentada constantemente:• pela escuta da Palavra de Deus tanto no livro daEscritura quanto no livro da vida;• pela participação na Eucaristia e demais celebrações; 225 Cf. Lc 24,32-35.83• pela oração generosa aberta a Deus e à sua presençana realidade humana;• pelo abandono ao Espírito, que precede a ação doevangelizador, assiste-o cotidianamente, confortando-o nas dificuldades e mesmo nos fracassos;• pela doação de si mesmo no serviço aos demais.”226Trata-se de aspectos fundamentais da espiritualidadedos discípulos missionários.226 CNBB. Doc. Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil:2003-2006, n. 101. São Paulo, Paulinas, 2003.
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