quarta-feira, 11 de março de 2015

CATEQUESE 2015 FAMÍLIA

CATEQUESE
CATEQUESE PAPA FRANCISCO
CATEQUESE PAPA FRANCISCO



A FAMÍLIA E OS IDOSOS I

IDOSOS SÃO RIQUEZA, NÃO PODEM SER ESQUECIDOS




Praça São Pedro – Vaticano
Quarta-feira, 4 de março de 2015

Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal

Queridos irmãos e irmãs, bom dia,

A catequese de hoje e a da próxima quarta-feira são dedicadas aos idosos, que no âmbito da família são os avós, os tios. Hoje, vamos refletir sobre a problemática condição atual dos idosos e, da próxima vez, isso é, na próxima quarta-feira, de forma mais positiva, sobre a vocação contida nesta idade da vida.

Graças aos progressos da medicina, a vida se alongou: mas a sociedade não se “alargou” à vida! O número de idosos se multiplicou, mas as nossas sociedades não se organizaram o suficiente para dar lugar a eles, com justo respeito e concreta consideração por sua fragilidade e sua dignidade. Enquanto somos jovens, somos induzidos a ignorar a velhice, como se fosse uma doença a manter distante; depois, quando nos tornamos velhos, especialmente se somos pobres, se estamos doentes, sozinhos, experimentamos as lacunas de uma sociedade programada sobre a eficiência, que consequentemente ignora os idosos. E os idosos são uma riqueza, não podem ser ignorados.

Bento XVI, visitando uma casa para idosos, usou palavras claras e proféticas, dizia assim: “A qualidade de uma sociedade, gostaria de dizer de uma civilização, se julga também pelo modo como os idosos são tratados e pelo lugar reservado a eles no viver comum” (12 de novembro de 2012). É verdade, a atenção aos idosos faz a diferença de uma civilização. Em uma civilização há atenção para o idoso? Há lugar para o idoso? Esta civilização seguirá adiante se souber respeitar a sabedoria, a sabedoria dos idosos. Em uma civilização em que não há lugar para os idosos ou são descartados porque criam problemas, esta sociedade leva consigo o vírus da morte.

No Ocidente, os estudiosos apresentam o século atual como o século do envelhecimento: os filhos diminuem, os velhos aumentam. Este desequilíbrio nos interpela, antes, é um grande desafio para a sociedade contemporânea. No entanto, uma cultura do lucro insiste em fazer os velhos parecerem um peso, um “lastro”. Não só não produzem, pensa esta cultura, mas são um fardo: em suma, qual é o resultado de pensar assim? São descartados. É ruim ver os idosos descartados, é uma coisa ruim, é pecado! Não se ousa a dizer isso abertamente, mas se faz isso! Há algo de vil nesta dependência à cultura do descartável. Mas nós estamos habituados a descartar pessoas. Queremos remover o nosso elevado medo da fraqueza e da vulnerabilidade; mas assim fazendo aumentamos nos idosos a angústia de serem mal suportados e abandonados.

Já no ministério de Buenos Aires, vi de perto esta realidade com os seus problemas: “Os idosos são abandonados, e não só na precariedade material. São abandonados na egoísta incapacidade de aceitar os seus limites que refletem os nossos limites, nas numerosas dificuldades que hoje devem superar para sobreviver em uma civilização que não permite a eles participar, ter uma palavra a dizer, nem de ser referência segundo o modelo consumista do ‘somente os jovens podem ser úteis e podem desfrutar’. Estes idosos deveriam, em vez disso, ser, para toda a sociedade, a reserva de sabedoria do nosso povo. Os idosos são a reserva de sabedoria do nosso povo! Com quanta facilidade se coloca para dormir a consciência quando não há amor!” (Só o amor pode nos salvar, Cidade do Vaticano 2013, p. 83). E assim acontece. Eu recordo, quando visitava as casas de repouso, falava com cada um e tantas vezes ouvi isso: “Como a senhora está? E os seus filhos? – Bem, bem – Quantos filhos a senhora tem? – Tantos. E eles vêm visitá-la? – Sim, sim, sempre, sim, vêm. – Quando vieram pela última vez?”. Recordo uma idosa que me dizia: “Foi no Natal”. Estávamos em agosto! Oito meses sem ser visitada pelos filhos, oito meses abandonada! Isto se chama pecado mortal, entendido? Uma vez, quando criança, a avó nos contava uma história de um avó idoso que, ao comer, se sujava porque não podia levar bem a colher com a sopa à boca. E o filho, o pai da família, decidiu tirá-lo da mesa comum e fez uma mesinha em uma cozinha, onde não podia ser visto, para que comesse sozinho. E assim não daria uma má impressão quando chegassem os amigos para almoçar ou jantar. Poucos dias depois, chegou à casa e encontrou o seu filho menor que brincava com a lenha e o martelo e os pregos fazendo alguma coisa ali, disse: “O que você está fazendo? Faço uma mesa, papai. – Uma mesa, para que? – Para você ter uma quando se tornar idoso, assim você pode comer ali”. As crianças têm mais consciência que nós!

Na tradição da Igreja, há uma riqueza de sabedoria que sempre apoiou uma cultura de proximidade aos idosos, uma disposição ao acompanhamento afetuoso e solidário nesta parte final da vida. Tal tradição está enraizada nas Sagradas Escrituras, como atestam, por exemplo, estas expressões do Livro do Eclesiástico: “Não desprezes os ensinamentos dos anciãos, pois eles aprenderam com seus pais. Estudarás com eles o conhecimento e a arte de responder com oportunidade” (Eclo 8, 11-12).

A Igreja não pode e não quer se conformar a uma mentalidade de impaciência e tão pouco de indiferença e desprezo em relação à velhice. Devemos despertar o sentido coletivo de gratidão, de apreço, de hospitalidade, que façam o idoso se sentir parte viva da sua comunidade.

Os idosos são homens e mulheres, pais e mães que foram antes de nós nessa nossa mesma estrada, na nossa mesma casa, na nossa cotidiana batalha por uma vida digna. São homens e mulheres de quem nós recebemos muito. O idoso não é um alienígena. O idoso somos nós: em breve, em muito tempo, inevitavelmente, de qualquer maneira, mesmo se nós não pensamos nisso. E se nós aprendemos a tratar bem os idosos, assim nos tratarão.

Frágeis todos somos um pouco. Alguns, porém, são particularmente frágeis, muitos são sozinhos, e marcados pela doença. Alguns dependem de cuidados indispensáveis e da atenção dos outros. Vamos dar um passo atrás nisso? Vamos abandoná-los ao próprio destino? Uma sociedade sem proximidade, onde a gratuidade e afeto sem contrapartida – mesmo entre estranhos – vai desaparecendo, é uma sociedade perversa. A Igreja, fiel à Palavra de Deus, não pode tolerar estas degenerações. Uma comunidade cristã em que a proximidade e a gratuidade não fossem mais consideradas indispensáveis, perderia com isso a sua alma. Onde não há honra para os idosos, não há futuro para os jovens.

CATEQUESE PAPA FRANCISCO

CATEQUESE PAPA FRANCISCO


O PAPEL DO IRMÃO NA FAMÍLIA

Praça São Pedro – Vaticano
Quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal

Queridos irmãos e irmãs, bom dia.

No nosso caminho de catequeses sobre família, depois de ter considerado o papel da mãe, do pai, dos filhos, hoje é a vez dos irmãos. “Irmão” e “irmã” são palavras que o cristianismo ama muito. E, graças à experiência familiar, são palavras que todas as culturas e todas as épocas compreendem.

A ligação fraterna tem um lugar especial na história do povo de Deus, que recebe a sua revelação no vivo da experiência humana. O salmista canta a beleza da ligação fraterna: “Eis como é belo e como é doce que os irmãos vivam juntos!” (Sal 132, 1). E isto é verdade, a fraternidade é bonita! Jesus Cristo levou à sua plenitude também esta experiência humana de ser irmãos e irmãs, assumindo-a no amor trinitário e potencializando-a de forma que vá bem além das ligações de parentesco e possa superar todo muro de estranheza.

Sabemos que quando a relação fraterna se arruína, quando se arruína as relações entre irmãos, se abre o caminho a experiências dolorosas de conflito, de traição, de ódio. A passagem bíblica de Caim e Abel constitui o exemplo deste êxito negativo. Depois do assassinato de Abel, Deus pergunta a Caim: “Onde está Abel, o teu irmão?”(Gen 4,9a). É uma pergunta que o Senhor continua a repetir a cada geração. E, infelizmente, não cessa de se repetir também a dramática resposta de Caim: “Não sei. Sou talvez eu o protetor do meu irmão?” (Gen 4,9b). A quebra do vínculo entre irmãos é uma coisa bruta e má para a humanidade. Também em família, quantos irmãos brigam por coisas pequenas, ou por uma herança e depois não se falam mais, não se saúdam mais. Isto é ruim! A fraternidade é uma coisa grande, quando se pensa que todos os irmãos habitaram o ventre da mesma mãe durante nove meses, vêm da mesma carne da mãe! E não se pode romper a fraternidade. Pensemos um pouco: todos conhecemos famílias que têm irmãos divididos, que brigaram; peçamos ao Senhor por estas famílias – talvez na nossa família há alguns casos – que os ajude a reunir os irmãos, a reconstituir a família. A fraternidade não deve ser rompida e quando se rompe acontece o que aconteceu com Caim e Abel. Quando o Senhor pergunta a Caim onde está o seu irmão, ele responde: “Mas, eu não sei, a mim não importa o meu irmão”. Isto é bruto, é uma coisa muito dolorosa de ouvir. Nas nossas orações sempre rezemos pelos irmãos que se dividiram.

A ligação de fraternidade que se forma em família entre os filhos, se acontece em um clima de educação à abertura aos outros, é a grande escola de liberdade e de paz. Na família, entre irmãos, se aprende a convivência humana, como se deve conviver em sociedade. Talvez nem sempre somos conscientes disso, mas é justamente a família que introduz a fraternidade no mundo! A partir dessa primeira experiência de fraternidade, alimentada pelos afetos e pela educação familiar, o estilo de fraternidade se irradia como uma promessa sobre toda a sociedade e sobre relações entre os povos.

A benção que Deus, em Jesus Cristo, derrama sobre este vínculo de fraternidade o dilata de um modo inimaginável, tornando-o capaz de ultrapassar toda diferença de nação, de língua, de cultura e até mesmo de religião.

Pensem o que se torna a ligação entre os homens, mesmo muito diferentes entre eles, quando podem dizer do outro: “Este é como um irmão, esta é como uma irmã para mim!”. Isso é belo! A história mostrou o suficiente que, mesmo a liberdade e a igualdade, sem fraternidade, podem se encher de individualismo e de conformismo, também de interesse pessoal.

A fraternidade em família resplandece de modo especial quando vemos a preocupação, a paciência, o afeto de que são circundados o irmãozinho ou a irmãzinha mais frágil, doente ou portador de necessidades especiais. Os irmãos e irmãs que fazem isso são muitos, em todo o mundo, e talvez não apreciamos o suficiente sua generosidade. E quando ou irmãos são tantos na família – hoje, cumprimentei uma família que tem nove filhos – o maior ou a maior ajuda o pai, a mãe a cuidar do menor. E é bonito este trabalho de ajuda entre os irmãos.

Ter um irmão, uma irmã que te quer bem é uma experiência forte, impagável, insubstituível. Do mesmo modo acontece para a fraternidade cristã. Os menores, os mais frágeis, os mais pobres devem nos sensibilizar: têm “direito” de nos tomar a alma e o coração. Sim, esses são nossos irmãos e como tais devemos amá-los e cuidar deles. Quando isso acontece, quando os pobres são como de casa, a nossa própria fraternidade cristã retoma a vida. Os cristãos, de fato, vão ao encontro dos pobres e frágeis não para obedecer a um programa ideológico, mas porque a palavra e o exemplo do Senhor nos dizem que todos somos irmãos. Este é o princípio do amor de Deus e de toda justiça entre os homens. Sugiro a vocês uma coisa: antes de terminar, faltam poucas linhas, em silêncio cada um de nós, pensemos nos nossos irmãos, nas nossas irmãs e em silêncio do coração rezemos por eles. Um instante de silêncio.

Bem, com essa oração levamos todos, irmãos e irmãs, com o pensamento, com o coração, aqui na praça para receber a benção.

Hoje, mais do que nunca, é necessário levar de volta a fraternidade ao centro da nossa sociedade tecnocrática e burocrática: então também a liberdade e a igualdade tomarão suas corretas entonações. Por isso, não privemos as nossas famílias da beleza de uma ampla experiência fraterna de filhos e filhas. E não percamos a nossa confiança na amplitude de horizonte que a fé é capaz de trazer desta experiência, iluminada pela benção de Deus.

CATEQUESE PAPA FRANCISCO

CATEQUESE PAPA FRANCISCO


FILHOS SÃO ALEGRIA DA FAMÍLIA E DA SOCIEDADE

Praça São Pedro – Vaticano
Quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Depois de ter refletido sobre as figuras da mãe e do pai, nestas catequeses sobre família gostaria de falar do filho, ou melhor, dos filhos. Inspiro-me em uma bela imagem de Isaías. Escreve o profeta: “Levanta os olhos e olha à tua volta: todos se reúnem para vir a ti; teus filhos chegam de longe, e tuas filhas são transportadas à garupa. Essa visão tornar-te-á radiante; teu coração palpitará e se dilatará” (60,4-5a). É uma imagem esplêndida, uma imagem da felicidade que se realiza na reunificação entre pais e filhos, que caminham juntos rumo a um futuro de liberdade e de paz, depois de um longo tempo de privações e de separação, quando o povo hebreu se encontrava distante da pátria.

De fato, há uma estreita ligação entre a esperança de um povo e a harmonia entre as gerações. Devemos pensar bem nisto. Há uma ligação estreita entre a esperança de um povo e a harmonia entre as gerações. A alegria dos filhos faz palpitar os corações dos pais e reabre o futuro. Os filhos são a alegria da família e da sociedade. Não são um problema de biologia reprodutiva, nem um dos tantos modos de se realizar. E tão pouco uma posse dos pais… Não. Os filhos são um dom, são um presente: entendem? Os filhos são um dom. Cada um é único e irrepetível; e ao mesmo tempo inconfundivelmente ligado às suas raízes. Ser filho e filha, segundo o desígnio de Deus, significa levar em si a memória e a esperança de um amor que se realizou justamente iluminando a vida de um outro ser humano, original e novo. E para os pais cada filho é si mesmo, é diferente, é diverso. Permitam-me uma recordação de família. Eu me lembro da minha mãe, dizia a nós – éramos cinco -: “Mas eu tenho cinco filhos”. Quando lhe perguntavam: “Qual é o teu preferido”, ela respondia: “Eu tenho cinco filhos, como cinco dedos [mostra os dedos da mão] Se me batem neste, me faz mal; se me batem neste outro, me faz mal. Me faz mal em todos os cinco. Todos são filhos meus, mas todos diferentes como os dedos de uma mão”. E assim é a família! Os filhos são diferentes, mas todos filhos.

Um filho é amado porque é filho: não porque é bonito, ou porque é assim ou assim; não, porque é filho! Não porque pensa como eu, ou encarna os meus desejos. Um filho é um filho: uma vida gerada por nós mas destinada a ele, ao seu bem, ao bem da família, da sociedade, de toda a humanidade.

Daqui vem também a profundidade da experiência humana de ser filho e filha, que nos permite descobrir a dimensão mais gratuita do amor, que nunca termina de nos surpreender. É a beleza de ser amado primeiro: os filhos são amados antes de chegarem. Quantas vezes as mães na praça me mostram a barriga e me pedem a benção… estas crianças são amadas antes de vir ao mundo. E esta é gratuidade, isto é amor; são amados antes do nascimento, como o amor de Deus que nos ama sempre primeiro. São amados antes de terem feito qualquer coisa para merecê-lo, antes de saber falar ou pensar, até mesmo antes de vir ao mundo! Ser filhos é a condição fundamental para conhecer o amor de Deus, que é a fonte última deste autêntico milagre. Na alma de cada filho, por quanto vulneráveis, Deus coloca o selo deste amor, que está na base da sua dignidade pessoal, uma dignidade que nada e ninguém poderá destruir.

Hoje parece mais difícil para os filhos imaginar o seu futuro. Os pais – mencionei em catequeses anteriores – deram talvez um passo para trás e os filhos se tornaram mais incertos em dar os seus passos adiante. Podemos aprender a boa relação entre as gerações com o nosso Pai Celeste, que deixa cada um de nós livre mas não nos deixa sozinhos nunca. E se erramos, Ele continua a nos seguir com paciência sem diminuir o seu amor por nós. O Pai celeste não dá passos para trás no seu amor por nós, nunca! Vai sempre adiante e, se não pode seguir adiante nos espera, mas não vai nunca para trás; quer que os seus filhos sejam corajosos e deem seus passos adiante.

Os filhos, por sua parte, não devem ter medo do empenho de construir um mundo novo: é justo para eles desejar que seja melhor que aquele que receberam! Mas isto deve ser feito sem arrogância, sem presunção. Dos filhos é preciso saber reconhecer o valor e aos pais se deve sempre dar honra.

O quarto mandamento pede aos filhos – e todos o somos! – para honrar o pai e a mãe (cfr Es 20, 12). Este mandamento vem logo depois daqueles que dizem respeito ao próprio Deus. De fato, contém algo de sagrado, algo de divino, algo que está na raiz de todo outro tipo de respeito entre os homens. E na formulação bíblica deste quarto mandamento, acrescenta-se: “para que se prolonguem os teus dias na terra que o Senhor teu Deus te dá”. A ligação virtuosa entre as gerações é garantia de futuro, e é garantia de uma história realmente humana. Uma sociedade de filhos que não honram os pais é uma sociedade sem honra; quando não se honram os pais se perde a própria honra! É uma sociedade destinada a se encher de jovens áridos e ávidos. Porém, também uma sociedade avarenta de gerações, que não ama circundar-se de filhos, que os considera sobretudo uma preocupação, um peso, um risco, é uma sociedade deprimida. Pensemos em tantas sociedades que conhecemos aqui na Europa: são sociedades deprimidas, porque não querem os filhos, não têm os filhos, o nível de nascimento não chega a um por cento. Por que? Cada um de nós pense e responda. Se uma família generosa de filhos é olhada como se fosse um peso, há algo errado! A geração dos filhos deve ser responsável, como ensina também a Encíclica Humanae vitae, do beato Papa Paulo VI, mas ter mais filhos não pode se tornar automaticamente uma escolha irresponsável. Não ter filhos é uma escolha egoísta. A vida rejuvenesce e conquista energias multiplicando-se: se enriquece, não se empobrece! Os filhos aprendem a cuidarem da própria família, amadurecem na partilha dos seus sacrifícios, crescem na apreciação dos seus dons. A agradável experiência da fraternidade anima o respeito e o cuidado dos pais, aos quais é preciso o nosso reconhecimento. Tantos de vocês aqui presentes têm filhos e todos somos filhos. Façamos uma coisa, um minuto de silêncio. Cada um de nós pense no seu coração nos próprios filhos – se tem – pense em silêncio. E todos nós pensemos nos nossos pais e agradeçamos a Deus pelo dom da vida. Em silêncio, aqueles que têm filhos pensem neles e todos nós pensemos nos nossos pais (silêncio). O Senhor abençoe os nossos pais e abençoe os vossos filhos.

Jesus, o Filho eterno, feito filho no tempo, ajude-nos a encontrar o caminho de uma nova irradiação desta experiência humana tão simples e tão grande que é ser filho. No multiplicar-se das gerações há um mistério de enriquecimento da vida de todos, que vem do próprio Deus. Devemos redescobri-lo, desafiando o preconceito; e vivê-lo, na fé, em perfeita alegria. E vos digo: quão belo é quando passo em meio a vocês e vejo os pais e as mães que levantam seus filhos para serem abençoados; isto é um gesto quase divino. Obrigado porque o fazem!



CATEQUESE PAPA FRANCISCO
A IMPORTÂNCIA DO PAI NA FAMÍLIA II


Sala Paulo VI – Vaticano
Quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Hoje gostaria de desenvolver a segunda parte da reflexão sobre a figura do pai na família. Na vez passada, falei do perigo dos pais “ausentes”, hoje quero olhar ao aspecto positivo. Também São José foi tentado a deixar Maria, quando descobriu que estava grávida: mas intervém o anjo do Senhor que lhe revelou o desígnio de Deus e a sua missão de pai adotivo; e José, homem justo, “toma consigo sua esposa” (Mt 1, 24) e se torna o pai da família de Nazaré.

Cada família precisa do pai. Hoje nos concentremos no valor do seu papel, e gostaria de partir de algumas expressões que se encontram no Livro dos Provérbios, palavras que um pai dirige ao próprio filho, e diz assim: “Filho meu, se o teu coração for sábio, também o meu será cheio de alegria. Exultarei dentro de mim, quando os teus lábios disserem palavras retas” (Pv 23, 15-16). Não se poderia exprimir melhor o orgulho e a comoção de um pai que reconhece ter transmitido ao filho aquilo que realmente conta na vida, ou seja, um coração sábio. Este pai não diz: “Estou orgulhoso de você porque és igual a mim, porque repetes as coisas que eu digo e que eu faço”. Não, não lhe diz simplesmente qualquer coisa. Diz-lhe algo de bem mais importante, que podemos interpretar assim: “Serei feliz toda vez que te ver agir com sabedoria e estarei comovido toda vez que te ouvir falar com retidão. Isso é aquilo que quis te deixar, para que se tornasse uma coisa tua: a atitude de sentir e agir, de falar e julgar com sabedoria e retidão. E para que tu pudesses ser assim, te ensinei coisas que não sabia, corrigi erros que não vias. Fiz você sentir um afeto profundo e ao mesmo tempo discreto, que talvez não reconhecestes plenamente quando eras jovem e incerto. Dei a você um testemunho de rigor e de firmeza que talvez você não entendeu, quando você quis somente cumplicidade e proteção. Precisei eu mesmo, primeiro, colocar-me à prova da sabedoria do coração e vigiar sobre os excessos de sentimento e do ressentimento, para levar o peso das inevitáveis incompreensões e encontrar as palavras certas para me fazer entender. Agora, continua o pai – quando vejo que você procura ser assim com os teus filhos, e com todos, me comovo. Sou feliz de ser teu pai”. É assim que diz um pai sábio, um pai maduro.

Um pai sabe bem quanto custa transmitir esta herança: quanta proximidade, quanta doçura e quanta firmeza. Porém, que consolo e recompensa se recebe quando os filhos honram esta herança! É uma alegria que redime todo cansaço, que supera toda incompreensão e cura toda ferida.

A primeira necessidade, então, é justamente essa: que o pai seja presença na família. Que seja próximo à mulher, para partilhar tudo, alegrias e dores, cansaços e esperanças. E que seja próximo aos filhos em seu crescimento: quando brincam e quando se empenham, quando estão despreocupados e quando estão angustiados, quando se exprimem e quando ficam em silêncio, quando ousam e quando têm medo, quando dão um passo errado e quando reencontram o caminho; pai presente, sempre. Dizer presente não é o mesmo que dizer controlador! Porque os pais muito controladores anulam os filhos, não os deixam crescer.

O Evangelho nos fala do exemplo do Pai que está nos céus – o único, diz Jesus, que pode ser chamado realmente “Pai bom” (cfr Mc 10, 18). Todos conhecem aquela extraordinária parábola chamada do “filho pródigo”, ou melhor, do “pai misericordioso”, que se encontra no Evangelho de Lucas no capítulo 15 (cfr 15, 11-32). Quanta dignidade e quanta ternura na espera daquele pai que está na porta da casa esperando que o filho retorne! Os pais devem ser pacientes. Tantas vezes não há outra coisa a fazer se não esperar; rezar e esperar com paciência, doçura, magnanimidade, misericórdia.

Um bom pai sabe esperar e sabe perdoar, do fundo do coração. Certo, sabe também corrigir com firmeza: não é um pai frágil, complacente, sentimental. O pai que sabe corrigir sem degradar é o mesmo que sabe proteger sem se economizar. Uma vez ouvi em uma reunião de matrimônio um pai dizer: “Algumas vezes preciso bater um pouco nos filhos… mas nunca no rosto para não degradá-los”. Que bonito! Tem sentido de dignidade. Deve punir, faz isso de modo justo, e segue adiante.

Portanto, se há alguém que pode explicar até o fundo a oração do “Pai nosso”, ensinada por Jesus, este é justamente quem vive em primeira pessoa a paternidade. Sem a graça que vem do Pai que está nos céus, os pais perdem a coragem e abandonam o campo. Mas os filhos precisam encontrar um pai que os espera quando retornam dos seus insucessos. Farão de tudo para não admitir isso, para não deixarem ver, mas precisam; e não encontrar isso abre feridas difíceis de curar.

A Igreja, nossa mãe, é empenhada em apoiar com todas as suas forças a presença boa e generosa dos pais nas famílias, porque esses são para as novas gerações protetores e mediadores insubstituíveis da fé na bondade, da fé na justiça e na proteção de Deus, como São José.


CATEQUESE PAPA FRANCISCO
A IMPORTÂNCIA DO PAI NA FAMÍLIA I

Sala Paulo VI – Vaticano
Quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Hoje gostaria de desenvolver a segunda parte da reflexão sobre a figura do pai na família. Na vez passada, falei do perigo dos pais “ausentes”, hoje quero olhar ao aspecto positivo. Também São José foi tentado a deixar Maria, quando descobriu que estava grávida: mas intervém o anjo do Senhor que lhe revelou o desígnio de Deus e a sua missão de pai adotivo; e José, homem justo, “toma consigo sua esposa” (Mt 1, 24) e se torna o pai da família de Nazaré.

Cada família precisa do pai. Hoje nos concentremos no valor do seu papel, e gostaria de partir de algumas expressões que se encontram no Livro dos Provérbios, palavras que um pai dirige ao próprio filho, e diz assim: “Filho meu, se o teu coração for sábio, também o meu será cheio de alegria. Exultarei dentro de mim, quando os teus lábios disserem palavras retas” (Pv 23, 15-16). Não se poderia exprimir melhor o orgulho e a comoção de um pai que reconhece ter transmitido ao filho aquilo que realmente conta na vida, ou seja, um coração sábio. Este pai não diz: “Estou orgulhoso de você porque és igual a mim, porque repetes as coisas que eu digo e que eu faço”. Não, não lhe diz simplesmente qualquer coisa. Diz-lhe algo de bem mais importante, que podemos interpretar assim: “Serei feliz toda vez que te ver agir com sabedoria e estarei comovido toda vez que te ouvir falar com retidão. Isso é aquilo que quis te deixar, para que se tornasse uma coisa tua: a atitude de sentir e agir, de falar e julgar com sabedoria e retidão. E para que tu pudesses ser assim, te ensinei coisas que não sabia, corrigi erros que não vias. Fiz você sentir um afeto profundo e ao mesmo tempo discreto, que talvez não reconhecestes plenamente quando eras jovem e incerto. Dei a você um testemunho de rigor e de firmeza que talvez você não entendeu, quando você quis somente cumplicidade e proteção. Precisei eu mesmo, primeiro, colocar-me à prova da sabedoria do coração e vigiar sobre os excessos de sentimento e do ressentimento, para levar o peso das inevitáveis incompreensões e encontrar as palavras certas para me fazer entender. Agora, continua o pai – quando vejo que você procura ser assim com os teus filhos, e com todos, me comovo. Sou feliz de ser teu pai”. É assim que diz um pai sábio, um pai maduro.

Um pai sabe bem quanto custa transmitir esta herança: quanta proximidade, quanta doçura e quanta firmeza. Porém, que consolo e recompensa se recebe quando os filhos honram esta herança! É uma alegria que redime todo cansaço, que supera toda incompreensão e cura toda ferida.

A primeira necessidade, então, é justamente essa: que o pai seja presença na família. Que seja próximo à mulher, para partilhar tudo, alegrias e dores, cansaços e esperanças. E que seja próximo aos filhos em seu crescimento: quando brincam e quando se empenham, quando estão despreocupados e quando estão angustiados, quando se exprimem e quando ficam em silêncio, quando ousam e quando têm medo, quando dão um passo errado e quando reencontram o caminho; pai presente, sempre. Dizer presente não é o mesmo que dizer controlador! Porque os pais muito controladores anulam os filhos, não os deixam crescer.

O Evangelho nos fala do exemplo do Pai que está nos céus – o único, diz Jesus, que pode ser chamado realmente “Pai bom” (cfr Mc 10, 18). Todos conhecem aquela extraordinária parábola chamada do “filho pródigo”, ou melhor, do “pai misericordioso”, que se encontra no Evangelho de Lucas no capítulo 15 (cfr 15, 11-32). Quanta dignidade e quanta ternura na espera daquele pai que está na porta da casa esperando que o filho retorne! Os pais devem ser pacientes. Tantas vezes não há outra coisa a fazer se não esperar; rezar e esperar com paciência, doçura, magnanimidade, misericórdia.

Um bom pai sabe esperar e sabe perdoar, do fundo do coração. Certo, sabe também corrigir com firmeza: não é um pai frágil, complacente, sentimental. O pai que sabe corrigir sem degradar é o mesmo que sabe proteger sem se economizar. Uma vez ouvi em uma reunião de matrimônio um pai dizer: “Algumas vezes preciso bater um pouco nos filhos… mas nunca no rosto para não degradá-los”. Que bonito! Tem sentido de dignidade. Deve punir, faz isso de modo justo, e segue adiante.

Portanto, se há alguém que pode explicar até o fundo a oração do “Pai nosso”, ensinada por Jesus, este é justamente quem vive em primeira pessoa a paternidade. Sem a graça que vem do Pai que está nos céus, os pais perdem a coragem e abandonam o campo. Mas os filhos precisam encontrar um pai que os espera quando retornam dos seus insucessos. Farão de tudo para não admitir isso, para não deixarem ver, mas precisam; e não encontrar isso abre feridas difíceis de curar.

A Igreja, nossa mãe, é empenhada em apoiar com todas as suas forças a presença boa e generosa dos pais nas famílias, porque esses são para as novas gerações protetores e mediadores insubstituíveis da fé na bondade, da fé na justiça e na proteção de Deus, como São José.


CATEQUESE PAPA FRANCISCO

AUSÊNCIA PATERNA

Sala Paulo VI – Vaticano
Quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Retomamos o caminho das catequeses sobre família. Hoje nos deixamos guiar pela palavra “pai”. Uma palavra mais que qualquer outra querida a nós cristãos, porque é o nome com o qual Jesus nos ensinou a chamar Deus: pai. Hoje o sentido deste nome recebeu uma nova profundidade justamente a partir do modo em que Jesus o usava para se dirigir a Deus e manifestar a sua especial relação com Ele. O mistério abençoado da intimidade de Deus, Pai, Filho e Espírito, revelado por Jesus, é o coração da nossa fé cristã.

“Pai” é uma palavra conhecida por todos, uma palavra universal. Essa indica uma relação fundamental cuja realidade é tão antiga quanto a história do homem. Hoje, todavia, chegou-se a afirmar que a nossa seria uma “sociedade sem pais”. Em outros termos, em particular na cultura ocidental, a figura do pai seria simbolicamente ausente, dissipada, removida. Em um primeiro momento, a coisa foi percebida como uma libertação: libertação do pai-patrão, do pai como representante da lei que se impõe de fora, do pai como censor da felicidade dos filhos e obstáculo da emancipação e da autonomia dos jovens. Às vezes, em algumas casas, reinava no passado o autoritarismo, em certos casos até mesmo a opressão: pais que tratavam os filhos como servos, não respeitando as exigências pessoais do crescimento deles; pais que não os ajudavam a empreender o seu caminho com liberdade – mas não é fácil educar um filho em liberdade – ; pais que não os ajudavam a assumir as próprias responsabilidades para construir o seu futuro e o da sociedade.

Isto, certamente, é uma atitude não boa; porém, como acontece muitas vezes, se passa de um extremo a outro. O problema dos nossos dias não parece mais ser tanto a presença invasiva dos pais quanto a sua ausência, a sua falta de ação. Os pais estão, por vezes, tão concentrados em si mesmos e no próprio trabalho e às vezes nas próprias realizações individuais a ponto de esquecer a família. E deixam sozinhos os pequenos e os jovens. Já como bispo de Buenos Aires senti o sentido de orfandade que vivem os jovens; muitas vezes eu perguntava aos pais se brincavam com os seus filhos, se tinham a coragem e o amor de perder tempo com os filhos. E a resposta era ruim, na maioria dos casos: “Mas, não posso, porque tenho tanto trabalho…” E o pai era ausente daquele filho que crescia, não brincava com ele, não, não perdia tempo com ele.

Ora, neste caminho comum de reflexão sobre família, gostaria de dizer a todas as comunidades cristãs que devemos ser mais atentos: a ausência da figura paterna na vida dos pequenos e dos jovens produz lacunas e feridas que podem ser também muito graves. E, de fato, os desvios de crianças e de adolescentes podem, em boa parte, ser atribuídos a esta falta, à carência de exemplos e de guias autoritárias em suas vidas de cada dia, à carência de proximidade, à carência de amor por parte dos pais. O sentido de orfandade que tantos jovens vivem é mais profundo que aquilo que pensamos.

São órfãos na família, porque os pais muitas vezes são ausentes, mesmo fisicamente, da casa, mas sobretudo porque, quando estão ali, não se comportam como pais, não dialogam com os seus filhos, não cumprem o seu papel educativo, não dão aos filhos, com o seu exemplo acompanhado de palavras, aqueles princípios, aqueles valores, aquelas regras de vida de que precisam como precisam do pão. A qualidade educativa da presença paterna é tanto mais necessária quanto mais o pai é obrigado pelo trabalho a estar distante de casa. Às vezes parece que os pais não sabem bem qual posto ocupar na família e como educar os filhos. E, então, na dúvida, se abstém, se retiram e negligenciam suas responsabilidades, talvez refugiando-se em uma improvável relação “em pé de igualdade” com os filhos. É verdade que você deve ser “companheiro” do teu filho, mas sem esquecer que você é o pai! Se você se comporta somente como um companheiro em pé de igualdade com o filho, isto não fará bem ao menino.

E vemos este problema também na comunidade civil. A comunidade civil, com as suas instituições, tem uma certa responsabilidade – podemos dizer paterna – com os jovens, uma responsabilidade que às vezes negligencia ou exerce mal. Também essa muitas vezes os deixa órfãos e não propõe a eles uma verdade de perspectiva. Os jovens permanecem, assim, órfãos de caminho seguros a percorrer, órfãos de mestres em quem confiar, órfãos de ideais que aquecem o coração, órfãos de valores e de esperanças que os apoiam cotidianamente. São preenchidos, talvez, por ídolos, mas se rouba o coração deles; são impelidos a sonhar com diversão e prazer, mas não se dá a eles o trabalho; são iludidos com o deus dinheiro, e se nega a eles as verdadeiras riquezas.

E então fará bem a todos, aos pais e aos filhos, escutar novamente a promessa que Jesus fez aos seus discípulos: “Não vos deixarei órfãos” (Jo 14, 18). É Ele, de fato, o Caminho a percorrer, o Mestre a escutar, a Esperança de que o mundo pode mudar, que o amor vence o ódio, que pode haver um futuro de fraternidade e de paz para todos. Alguém de vocês poderá me dizer: “Mas, padre, hoje o senhor foi muito negativo. Falou somente da ausência dos pais, o que acontece quando os pais não são próximos aos filhos…” É verdade, quis destacar isso, porque na quarta-feira que vem prosseguirei esta catequese colocando o foco na beleza da paternidade. Por isso escolhi começar pelo escuro para chegar à luz. Que o Senhor nos ajude a entender bem estas coisas. Obrigado.


CATEQUESE PAPA FRANCISCO


A FAMÍLIA E O SÍNODO
Praça São Pedro
Quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal

Queridos irmãos e irmãs, bom dia,

Concluímos um ciclo de catequeses sobre a Igreja. Agradeçamos ao Senhor que nos fez percorrer este caminho redescobrindo a beleza e a responsabilidade de pertencer à Igreja, de ser Igreja, todos nós.

Agora iniciamos uma nova etapa, um novo ciclo, e o tema será a família; um tema que se insere neste tempo intermediário entre duas Assembleias do Sínodo dedicadas a esta realidade tão importante. Por isso, antes de entrar no percurso de diversos aspectos da vida familiar, hoje desejo partir justamente da Assembleia sinodal do mês de outubro passado, que tinha este tema: “Os desafios pastorais da família no contexto da nova evangelização”. É importante recordar como se desenvolveu e o que produziu, como aconteceu e o que produziu.

Durante o Sínodo, a mídia fez o seu trabalho – havia muita espera, muita atenção – e a agradecemos porque o fizeram também com abundância. Tantas notícias, tantas! Isto foi possível graças à Sala de Imprensa, que cada dia fez um briefing. Mas muitas vezes a visão da mídia era um pouco no estilo de crônicas esportivas, ou políticas: falava-se muitas vezes de dois times, pró e contra, conservadores e progressistas, etc. Hoje gostaria de contar aquilo que foi o Sínodo.

Antes de tudo, pedi aos padres sinodais para falar com franqueza e coragem e escutar com humildade, dizer com coragem tudo aquilo que tinham no coração. No Sínodo, não houve censura prévia, mas cada um podia, mais ainda, devia dizer aquilo que tinha no coração, aquilo que pensava sinceramente. “Mas isto dará discussão”. É verdade, ouvimos como os apóstolos discutiram. Diz o texto: saiu uma forte discussão. Os apóstolos repreendiam-se entre eles, porque procuravam a vontade de Deus sobre os pagãos, se podiam entrar na Igreja ou não. Era uma coisa nova. Sempre, quando se procura a vontade de Deus, em uma assembleia sinodal, há diversos pontos de vista e há a discussão e isto não é uma coisa ruim! Sempre que se faça com humildade e com alma de serviço à assembleia dos irmãos. Seria uma coisa ruim a censura prévia. Não, não. Cada um devia dizer aquilo que pensava. Depois do relatório inicial do Cardeal Erdő, houve um primeiro momento, fundamental, no qual todos os padres sinodais puderam falar e todos escutaram. E era edificante aquela atitude de escuta que tinham os padres. Um momento de grande liberdade, em que cada um expôs o seu pensamento com parresia e com confiança. Na base das intervenções estava o Instrumento de Trabalho, fruto da precedente consulta de toda a Igreja. E aqui devemos agradecer à Secretaria do Sínodo pelo grande trabalho que fez seja antes seja durante a Assembleia. Realmente foram bravíssimos.

Nenhuma intervenção colocou em discussão as verdades fundamentais do Sacramento do Matrimônio, isso é: a indissolubilidade, a unidade, a fidelidade e a abertura à vida (cfr Conc. Ecum. Vat. II Gaudium et spes, 48; Código de Direito Canônico, 1055-1056). Isso não foi tocado.

Todas as intervenções foram coletadas e assim se chegou ao segundo momento, isso é um esboço que se chama Relatório depois da discussão. Também este relatório foi desenvolvido pelo Cardeal Erdő, articulado em três pontos: a escuta do contexto e dos desafios da família; o olhar fixo sobre Cristo e o Evangelho da família; o confronto com as perspectivas pastorais.

Sobre esta primeira proposta de síntese se desenvolveu a discussão nos grupos, que foi o terceiro momento. Os grupos, como sempre, estavam divididos por línguas, porque é melhor assim, comunica-se melhor: italiano, inglês, espanhol e francês. Cada grupo, no fim do seu trabalho, apresentou um relatório e todos os relatórios dos grupos foram publicados. Tudo foi dado, para a transparência para que se soubesse o que acontecia.

Naquele ponto – é o quarto momento – uma comissão examinou todos as sugestões que surgiram dos grupos linguísticos e foi feito o Relatório final, que manteve o esquema precedente – escuta da realidade, olhar ao Evangelho e empenho pastoral – mas procurou incorporar o fruto das discussões nos grupos. Como sempre, foi aprovada também uma mensagem final do Sínodo, mais breve e mais de divulgação com relação ao Relatório.
Este foi o desenvolvimento da Assembleia sinodal. Alguns de vocês podem me perguntar: “Os padres brigaram?”. Não sei se brigaram, mas que falaram forte, sim, é verdade. E esta é a liberdade, é justamente a liberdade que há na Igreja. Tudo aconteceu “cum Petro et sub Petro”, isso é, com a presença do Papa, que é garantia para todos de liberdade e de confiança, garantia da ortodoxia. E no fim com a minha intervenção dei uma leitura sintética da experiência sinodal.

Então, os documentos oficiais que saíram do Sínodo são três: a mensagem final, o relatório final e o discurso final do Papa. Não há outros.

O Relatório final, que foi o ponto de chegada de toda a reflexão das dioceses até aquele momento, ontem foi publicado e enviado às Conferências Episcopais, que será discutido em vista da próxima Assembleia, aquela Ordinária, em outubro de 2015. Digo que ontem foi publicada – já havia sido publicada – mas ontem foi publicada com perguntas dirigidas às Conferências Episcopais e assim se torna justamente Lineamenta do próximo Sínodo.

Devemos saber que o Sínodo não é um parlamento, vem o representante desta Igreja, desta Igreja, desta Igreja… Não, não é isto. Vem o representante, sim, mas a estrutura não é parlamentar, é totalmente diferente. O Sínodo é um espaço protegido a fim de que o Espírito Santo possa trabalhar; não houve confronto entre facções, como em parlamento onde isto é permitido, mas um confronto entre os bispos, que veio depois de um longo trabalho de preparação e que agora prosseguirá em um outro trabalho, para o bem das famílias, da Igreja e da sociedade. É um processo, é o normal caminho sinodal. Agora este Relatório volta às Igrejas particulares e assim continua nesse trabalho de oração, reflexão e discussão fraterna a fim de preparar a próxima Assembleia. Este é o Sínodo dos Bispos. Confiemo-lo à proteção da Virgem nossa Mãe. Que ela nos ajude a seguir a vontade de Deus tomando as decisões pastorais que ajudem mais e melhor a família. Peço-vos para acompanhar este percurso sinodal até o próximo Sínodo com a oração. Que o Senhor nos ilumine, nos faça andar rumo à maturidade daquilo que, como Sínodo, devemos dizer a todas as Igrejas. E sobre isso é importante a vossa oração.