terça-feira, 27 de janeiro de 2009

I PARTE
A CATEQUESE NA MISSÃO EVANGELIZADORA DA IGREJA
A catequese na missão evangelizadora da Igreja
« Ide por todo o mundo, proclamai o Evangelho a toda criatura » (Mc 16,15)« Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei » (Mt 28,19-20).« Recebereis uma força, a do Espírito Santo que descerá sobre vós, e sereis minhas testemunhas... até os confins da terra » (At 1,8).
O mandato missionário de Jesus
34. Jesus, após a sua ressurreição, enviou por parte do Pai o Espírito Santo para que realizasse, a partir de dentro, a obra da salvação e estimulasse os discípulos a continuarem a sua própria missão no mundo inteiro, como ele mesmo fora enviado pelo Pai. Ele foi o primeiro e o maior evangelizador. Anunciou o Reino de Deus,(66) como nova e definitiva intervenção divina na história e definiu este anúncio como « o Evangelho », ou seja, a boa nova. A este dedicou toda a sua existência terrena: deu a conhecer a alegria de pertencer ao Reino,(67) as suas exigências e a sua magna carta,(68) os mistérios que encerra,(69) a vida fraterna daqueles que nele entram,(70) e a sua plenitude futura.(71)
Significado e finalidade desta parte
35. Esta primeira parte pretende definir o caráter próprio da catequese.
O primeiro capítulo, relativo à estrutura teológica, recorda brevemente o conceito de Revelação exposto no Documento conciliar Dei Verbum. Ele determina, de maneira específica, o modo de conceber o ministério da Palavra. Os conceitos palavra de Deus, Evangelho, Reino de Deus e Tradição, presentes nessa Constituição dogmática, fundam o significado de catequese. Junto a esses, é referencial obrigatório para a catequese o conceito de evangelização. A sua dinâmica e os seus elementos são expostos com uma precisão nova e profunda, na Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi.
O segundo capítulo situa a catequese no quadro da evangelização e a coloca em relação com as demais formas de ministério da palavra de Deus. Graças a essa relação, descobre-se mais facilmente o caráter próprio da catequese.
O terceiro capítulo analisa mais diretamente a catequese enquanto tal: a sua natureza eclesial, a sua finalidade vinculativa de comunhão com Jesus Cristo, os seus deveres, e a inspiração catecumenal que a anima.
A concepção que se tem da catequese condiciona profundamente a seleção e a organização dos seus conteúdos (cognitivos, experienciais e comportamentais), precisa os seus destinatários e define a pedagogia que se exige para alcançar os seus objetivos.
O termo catequese sofreu uma evolução semântica durante os vinte séculos de história da Igreja. Neste Diretório, o conceito de catequese inspira-se nos Documentos do Magistério Pontifício pósconciliar e, sobretudo, na Evangelii Nuntiandi, na Catechesi Tradendae e na Redemptoris Missio.
I CAPÍTULO
A Revelação e a sua transmissão mediante a evangelização
« Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos abençoou com toda a sorte de bênçãos espirituais, nos céus, em Cristo. (...) dando-nos a conhecer o mistério da sua vontade, conforme decisão prévia que lhe aprouve tomar para levar o tempo à sua plenitude: a de em Cristo encabeçar todas as coisas... » (Ef 1,3-10).
A Revelação do desígnio providencial de Deus
36. « Deus, que cria e conserva todas as coisas por meio do Verbo, oferece aos homens, na criação, um perene testemunho de si mesmo ». (72) O homem, que por sua natureza e vocação é « capaz de Deus », quando ouve a mensagem das criaturas, pode atingir a certeza da existência de Deus como causa e fim de tudo e que Ele pode se revelar ao homem.
A constituição Dei Verbum do Concílio Vaticano II descreveu a Revelação como o ato mediante o qual Deus se manifesta pessoalmente aos homens. Deus se mostra, de fato, como Aquele que quer comunicar a Si mesmo, tornando a pessoa humana partícipe de sua natureza divina. (73) Dessa maneira, Ele realiza o seu desígnio de amor.
« Aprouve a Deus, em sua bondade e sabedoria, revelar-Se a Si mesmo e tornar conhecido o mistério de Sua vontade, pelo qual os homens... têm acesso ao Pai e se tornam participantes da natureza divina ». (74)
37. Este desígnio providencial (75) do Pai, revelado plenamente em Jesus Cristo, realiza-se com a força do Espírito Santo.
Ele comporta:
– a revelação de Deus, da sua « verdade íntima »,(76) do seu « segredo », (77) da verdadeira vocação e dignidade do homem; (78)
– a oferta da salvação a todos os homens, como dom da graça e da misericórdia de Deus, (79) que implica a libertação do mal, do pecado e da morte; (80)
– o definitivo chamado para reunir na família de Deus todos os filhos dispersos, realizando assim a união fraterna entre os homens. (81)
A Revelação: fatos e palavras
38. Deus, na sua imensidão, para se revelar à pessoa humana, utiliza uma pedagogia: (82) serve-se de eventos e de palavras humanas para comunicar o seu desígnio; e o faz progressivamente e por etapas, (83) para se aproximar melhor dos homens. Deus, de fato, age de maneira tal, que os homens cheguem ao conhecimento do seu plano salvífico através dos eventos da história da salvação e mediante as palavras divinamente inspiradas que os acompanham e os explicam.
« Este plano da Revelação se concretiza através de acontecimentos e palavras intimamente conexos entre si, de forma que
– as obras realizadas por Deus na história da salvação manifestam e corroboram os ensinamentos e as realidades significadas pelas palavras,
– enquanto as palavras, por sua vez, proclamam as obras e elucidam o mistério nelas contido ».(84)
39. Também a evangelização, que transmite ao mundo a Revelação, realiza-se com obras e palavras. Ela é, ao mesmo tempo, testemunho e anúncio, palavra e sacramento, ensinamento e empenho.
A catequese, por sua vez, transmite os fatos e as palavras da Revelação: deve proclamá-los e narrá-los e, ao mesmo tempo, explicar os profundos mistérios que estes encerram. Além disso, sendo a Revelação fonte de luz para a pessoa humana, a catequese não apenas recorda as maravilhas de Deus operadas no passado mas, à luz da mesma Revelação, interpreta os sinais dos tempos e a vida presente dos homens e das mulheres, uma vez que, neles, realiza-se o desígnio de Deus para a salvação do mundo. (85)
Jesus Cristo, mediador e plenitude da Revelação
40. Deus revelou-se progressivamente aos homens, por meio dos profetas e dos eventos salvíficos, até à plenitude da Revelação com o envio de seu próprio Filho: (86)
« Jesus Cristo, pela plena presença e manifestação de Si mesmo, por palavras e obras, sinais e milagres, e especialmente por sua morte e gloriosa ressurreição dentre os mortos, enviado finalmente o Espírito de verdade, aperfeiçoa e completa a Revelação ».(87)
Jesus Cristo não é somente o maior dos profetas, mas é o Filho eterno de Deus, feito homem. Ele é, portanto, o evento último para o qual convergem todos os eventos da história da salvação.(88) Ele é, de fato, « a Palavra única, perfeita e insuperável do Pai ». (89)
41. O ministério da Palavra deve ressaltar esta admirável característica, própria da economia da Revelação: o Filho de Deus entra na história dos homens, assume a vida e a morte humanas e realiza a nova e definitiva aliança entre Deus e os homens. É dever próprio da catequese mostrar quem é Jesus Cristo: a sua vida e o seu mistério, e apresentar a fé cristã como seqüela da sua pessoa.(90) Por isso, deve basear-se constantemente nos Evangelhos, os quais « são o coração de todas as Escrituras, uma vez que constituem o principal testemunho sobre a vida e a doutrina do Verbo encarnado, nosso Salvador.(91)
O fato que Jesus Cristo seja a plenitude da Revelação é o fundamento do « cristocentrismo » (92) da catequese: o mistério de Cristo, na mensagem revelada, não é um elemento a mais, junto aos demais, mas sim o centro a partir do qual todos os demais elementos se hierarquizam e se iluminam.
A transmissão da Revelação por meio da Igreja, obra do Espírito Santo
42. A revelação de Deus, culminada em Jesus Cristo, é destinada a toda a humanidade: « Deus quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade » (1 Tm 2,4). Em virtude dessa vontade salvífica universal, Deus dispôs que a Revelação se transmitisse a todos os povos e a todas as gerações e permanecesse íntegra. (93)
43. Para cumprir este desígnio divino, Jesus Cristo instituiu a Igreja com fundamento nos apóstolos e, mandando sobre eles o Espírito Santo, por parte do Pai, enviou-os a pregar o Evangelho em todo o mundo. Os apóstolos, com palavras, obras e por escrito, executaram fielmente tal mandato.(94)
Esta Tradição apostólica perpetua-se na Igreja e por meio da Igreja. E esta, no seu todo, pastores e fiéis, vigia por sua conservação e transmissão. O Evangelho, de fato, conserva-se íntegro e vivo na Igreja: os discípulos de Jesus o contemplam e o meditam incessantemente, vivem-no na existência cotidiana e o anunciam na missão. O Espírito Santo fecunda constantemente a Igreja enquanto ela vive o Evangelho; faz com que ela cresça continuamente na compreensão do mesmo, e a impulsiona e sustenta na tarefa de anunciá-lo em todos os recantos do mundo.(95)
44. A conservação íntegra da Revelação, palavra de Deus contida na Tradição e na Escritura, assim como a sua contínua transmissão, são garantidas na sua autenticidade. O Magistério da Igreja, sustentado pelo Espírito Santo e dotado do « carisma da verdade », exercita a função de « interpretar autenticamente a Palavra de Deus ».(96)
45. A Igreja, « sacramento universal de salvação »,(97) movida pelo Espírito Santo, transmite a Revelação por meio da evangelização: anuncia a boa nova do desígnio salvífico do Pai e, nos sacramentos, comunica os dons divinos.
A Deus, que se revela, é devida a obediência da fé, pela qual o homem adere livremente ao « Evangelho da graça de Deus » (At 20,24), com pleno assentimento do intelecto e da vontade. Guiado pela fé, dom do Espírito, o homem chega à contemplar e a saborear o Deus do amor, que em Cristo revelou as riquezas da sua glória.(98)
A evangelização(99)
46. A Igreja « existe para evangelizar », (100) isto é, para « levar a Boa Nova a todas as parcelas da humanidade, em qualquer meio e latitude, e pelo seu influxo transformá-las a partir de dentro e tornar nova a própria humanidade ». (101)
O mandato missionário de Jesus comporta vários aspectos intimamente conexos entre si: « proclamai » (Mc 16,15), « fazei discípulos e ensinai », (102) « sereis minhas testemunhas », (103) « batizai », (104) « fazei isto em minha memória » (Lc 22,19), « amai-vos uns aos outros » (Jo 15,12). Anúncio, testemunho, ensinamento, sacramentos, amor ao próximo, fazer discípulos: todos estes aspectos são via e meios para a transmissão do único Evangelho, e constituem os elementos da evangelização.
Alguns deles se revestem de uma importância tão grande que, às vezes, se tende a identificá-los com a ação evangelizadora. Todavia, « nenhuma definição parcial e fragmentária, porém, chegará a dar razão da realidade rica, complexa e dinâmica que é a evangelização ». (105) Corre-se o risco de empobrecê-la e até mesmo de mutilá-la. Ao contrário, ela deve desenvolver a « sua totalidade » (106) e incorporar as suas intrínsecas bipolaridades: testemunho e anúncio, (107) palavra e sacramento, (108) mudança interior e transformação social. (109) Os agentes da evangelização devem saber agir com uma « visão global » (110) da mesma e identificá-la com o conjunto da missão da Igreja. (111)
O processo da evangelização
47. A Igreja, embora contendo em si, permanentemente, a plenitude dos meios da salvação, opera sempre de modo gradual. (112) O decreto conciliar Ad Gentes esclareceu bem a dinâmica do processo evangelizador: testemunho cristão, diálogo e presença da caridade (11-12), anúncio do Evangelho e chamado à conversão (13), catecumenato e iniciação cristã (14), formação da comunidade cristã por meio dos sacramentos e dos ministérios (15-18). (113) Este é o dinamismo da implantação e da edificação da Igreja.
48. De acordo com isso, é necessário conceber a evangelização como o processo através do qual a Igreja, movida pelo Espírito, anuncia e difunde o Evangelho em todo o mundo. Ela:
– impulsionada pela caridade, impregna e transforma toda a ordem temporal, assumindo e renovando as culturas; (114)
– dá testemunho, (115) entre os povos, do novo modo de ser e de viver que caracteriza os cristãos;
– proclama explicitamente o Evangelho, mediante o « primeiro anúncio », (116) chamando à conversão; (117)
– inicia na fé e na vida cristã, mediante a «catequese » (118) e os « sacramentos de iniciação », (119) aqueles que se convertem a Jesus Cristo, ou aqueles que retomam o caminho de sua seqüela, incorporando os primeiros na comunidade cristã e a ela reconduzindo os demais; (120)
– alimenta constantemente o dom da comunhão (121) nos fiéis, mediante a educação permanente da fé (homilia, outras formas do ministério da Palavra), os sacramentos e o exercício da caridade;
– suscita continuamente a missão, (122) enviando todos os discípulos de Cristo a anunciarem o Evangelho, com palavras e obras, em todo o mundo.
49. O processo evangelizador, (123) conseqüentemente, é estruturado em etapas ou « momentos essenciais »: (124) a ação missionária para os não crentes e para aqueles que vivem na indiferença religiosa; a ação catequética e de iniciação para aqueles que optam pelo Evangelho e para aqueles que necessitam completar ou reestruturar a sua iniciação; e a ação pastoral para os fiéis cristãos já maduros, no seio da comunidade cristã. (125) Esses momentos, no entanto, não são etapas concluídas: reiteram-se, se necessário, uma vez que darão o alimento evangélico mais adequado ao crescimento espiritual de cada pessoa ou da própria comunidade.
O ministério da Palavra de Deus na evangelização
50. O ministério da Palavra (126) é elemento fundamental da evangelização. A presença cristã, em meio aos diferentes grupos humanos, e o testemunho de vida precisam ser esclarecidos e justificados pelo anúncio explícito de Jesus Cristo, o Senhor. « Não há verdadeira evangelização se o nome, o ensinamento, a vida e as promessas, o Reino, o mistério de Jesus de Nazaré, Filho de Deus, não forem proclamados ». (127) Mesmo aqueles que já são discípulos de Cristo têm necessidade de ser alimentados constantemente com a palavra de Deus, para crescerem na sua vida cristã. (128)
O ministério da Palavra, no interior da evangelização, transmite a Revelação por meio da Igreja, valendo-se das « palavras » humanas. Estas, porém, são sempre em referência às « obras »: àquelas que Deus realizou e continua a realizar, especialmente nos sacramentos; ao testemunho de vida dos cristãos; à ação transformadora que estes, unidos a tantos homens de boa vontade, realizam no mundo. Esta palavra humana da Igreja é o meio de que o Espírito Santo se serve, para continuar o diálogo com a humanidade. Ele é, de fato, o principal agente do ministério da Palavra, aquele por meio do qual « a viva voz do Evangelho ressoa na Igreja, e por meio desta, no mundo ». (129)
O ministério da Palavra exercita-se « de muitas formas ». (130) A Igreja, desde a época apostólica, (131) no seu desejo de oferecer a palavra de Deus da maneira mais apropriada, tem realizado este ministério através das mais variadas formas. (132) Todas elas servem para veicular aquelas funções basilares que o ministério da Palavra é chamado a desempenhar.
Funções e formas do ministério da Palavra
51. As principais funções do ministério da Palavra são as seguintes:
– Convocação e chamado à fé
É a função que mais imediatamente se deduz do mandato missionário de Jesus. Realiza-se mediante o « primeiro anúncio », dirigido aos não crentes: aqueles que fizeram uma opção de nãocrença, os batizados que vivem às margens da vida cristã, os praticantes de outras religiões... (133) O despertar religioso das crianças, nas famílias cristãs, é também uma forma eminente desta função.
– A iniciação
Aqueles que, movidos pela graça, decidem seguir Jesus, são « introduzidos na vida religiosa, litúrgica e caritativa do Povo de Deus ». (134) A Igreja realiza esta função, fundamentalmente por meio da catequese, em estreita relação com os sacramentos da iniciação, tanto se estes devem ser ainda recebidos quanto se já o foram. Formas importantes são: a catequese dos adultos não batizados, no catecumenato; a catequese dos adultos batizados que desejam retornar à fé, ou daqueles que têm necessidade de completar a sua iniciação; a catequese das crianças e dos mais jovens, que por si só, já tem um caráter de iniciação. Também a educação cristã familiar e o ensino escolar da religião exercem uma função de iniciação.
– A educação permanente à fé
Em diversas regiões, ela é chamada também de « catequese permanente ». (135)
Dirige-se aos cristãos iniciados nos elementos de base, que têm necessidade de alimentar e amadurecer constantemente a sua fé, durante toda a vida. É uma função que se realiza através de formas muito variadas: « sistemáticas e ocasionais, individuais e comunitárias, organizadas e espontâneas, etc. ». (136)
– A função litúrgica
O ministério da Palavra compreende também uma função litúrgica, uma vez que, quando ele se realiza no âmbito de uma ação sacra, é parte integrante da mesma. (137) Ele se exprime de maneira eminente através da homilia. Outras formas são as intervenções e as exortações durante as celebrações da palavra. É preciso também fazer referência à preparação imediata aos diversos sacramentos, às celebrações sacramentais e, sobretudo, à participação dos fiéis na Eucaristia, como forma fundamental da educação da fé.
– A função teológica
Ela busca desenvolver a compreensão da fé, colocando-se na dinâmica da « fides quaerens intellectum », ou seja, da fé que procura entender. (138) A teologia, para cumprir esta função, precisa confrontar-se ou dialogar com as formas filosóficas do pensamento, com os humanismos que conotam a cultura e com as ciências do homem. Articula-se em formas que promovem « a abordagem sistemática e a pesquisa científica das verdades da fé ». (139)
52. São formas importantes do ministério da Palavra: o primeiro anúncio ou pregação missionária, a catequese pré e pós-batismal, a forma litúrgica e a forma teológica. Acontece, com freqüência, que tais formas, por circunstâncias pastorais, devam assumir mais de uma função. A catequese, por exemplo, junto à sua função de iniciação, deve exercitar, freqüentemente, tarefas missionárias. A própria homilia, de acordo com as circunstâncias, será conveniente que assuma as funções de convocação e de iniciação orgânica.
A conversão e a fé
53. Ao anunciar ao mundo a Boa Nova da Revelação, a evangelização convida homens e mulheres à conversão e à fé. 140 O chamado de Jesus, « arrependei-vos e crede no Evangelho » (Mc 1,15), continua a ressoar hoje, mediante a evangelização da Igreja. A fé cristã é, antes de mais nada, conversão a Jesus Cristo, (141) adesão plena e sincera à sua pessoa, e decisão de caminhar na sua seqüela. (142) A fé é um encontro pessoal com Jesus Cristo, é tornar-se seu discípulo. Isso exige o empenho permanente de pensar como Ele, de julgar como Ele e de viver como Ele viveu. (143) Assim, o crente se une à comunidade dos discípulos e assume, como sua, a fé da Igreja. (144)
54. Este « sim » a Jesus Cristo, plenitude da Revelação do Pai, encerra em si uma dupla dimensão: o confiante abandono em Deus e a amorosa adesão a tudo aquilo que Ele nos revelou. Isto é possível somente mediante a ação do Espírito Santo: (145)
« Com a fé, o homem livremente se entrega todo a Deus, prestando ao Deus revelador, um obséquio pleno do intelecto e da vontade, e dando voluntário assentimento à revelação feita por Ele ». (146)
« Crer, portanto, tem uma dupla referência: à pessoa e à verdade; à verdade por confiança na pessoa que a atesta ». (147)
55. A fé comporta uma transformação de vida, uma « metanóia », (148) ou seja, uma profunda transformação da mente e do coração; faz com que o crente viva aquela « nova maneira de ser, de viver, de estar junto com os outros que o Evangelho inaugura ». (149) Esta transformação de vida manifesta-se em todos os níveis da existência do cristão: na sua vida interior de adoração e de acolhimento da vontade divina; na sua participação ativa na missão da Igreja; na sua vida matrimonial e familiar; no exercício da vida profissional; no cumprimento das atividades econômicas e sociais.
A fé e a conversão brotam do « coração », isto é, do mais profundo da pessoa humana, envolvendo-a inteira. Encontrando Jesus e aderindo a Ele, o ser humano vê realizadas as suas mais profundas aspirações; encontra tudo aquilo que sempre buscou e o encontra abundantemente. (150) A fé responde àquela « ânsia », (151) freqüentemente inconsciente e sempre limitada, de conhecer a verdade sobre Deus, sobre o próprio homem e sobre o destino que o espera. É como uma água pura (152) que reaviva o caminho do homem, peregrino em busca de seu lar.
A fé é um dom de Deus. Pode nascer do íntimo do coração humano somente como fruto da « graça prévia e adjuvante » (153) e como resposta, completamente livre, à moção do Espírito Santo, que move o coração e o dirige a Deus, dando-lhe « suavidade no consentir e crer na verdade ». (154)
A Virgem Maria viveu, no modo mais perfeito, estas dimensões da fé. A Igreja venera n'Ela, « a mais pura realização da fé ». (155)
O processo da conversão permanente
56. A fé é um dom destinado a crescer no coração dos crentes. (156) A adesão a Jesus Cristo, de fato, inicia um processo de conversão permanente, que dura toda a vida. (157) Quem acede à fé é como uma criança recém-nascida (158) que, pouco a pouco, crescerá e se converterá num ser adulto que tende ao « estado de homem feito », (159) à maturidade da plenitude em Cristo.
No processo de fé e de conversão podem-se revelar, do ponto de vista teológico, diversos momentos importantes:
a) O interesse pelo Evangelho. O primeiro momento é aquele em que, no coração do não crente, do indiferente ou do praticante de outra religião, nasce, como conseqüência do primeiro anúncio, um interesse pelo Evangelho, sem ser ainda uma decisão firme. Aquele primeiro movimento do espírito humano para a fé, que já é fruto da graça, recebe diversos nomes: « propensão à fé », (160) « preparação evangélica », (161) inclinação a crer, « procura religiosa ». (162) A Igreja denomina « simpatizantes » (163) aqueles que mostram essa inquietação.
b) A conversão. Este primeiro interesse pelo Evangelho necessita de um tempo de busca (164) para poder-se transformar em uma opção sólida. A decisão para a fé deve ser avaliada e amadurecida. Tal busca, movida pelo Espírito Santo e pelo anúncio do kerigma, prepara a conversão que será — certamente — « inicial », (165) mas que já traz consigo a adesão a Jesus Cristo e a vontade de caminhar na sua seqüela. Esta « opção fundamental » funda toda a vida cristã do discípulo do Senhor. (166)
c) A profissão de fé. O abandonar-se a Jesus Cristo gera nos crentes o desejo de conhecê-Lo mais profundamente e de identificar-se com Ele. A catequese os inicia no conhecimento da fé e no aprendizado da vida cristã, favorecendo um caminho espiritual que provoca uma « progressiva transformação de mentalidade e costumes », (167) feita de renúncias e de lutas, mas também de alegrias que Deus concede sem medida. O discípulo de Jesus Cristo torna-se, então, idôneo a fazer uma viva, explícita e operante profissão de fé. (168)
d) O caminho rumo à perfeição. Esta maturidade de base, da qual nasce a profissão de fé, não é o ponto final no processo permanente de conversão. A profissão de fé batismal coloca-se como fundamento de um edifício espiritual destinado a crescer. O batizado, impulsionado sempre pelo Espírito Santo, alimentado pelos sacramentos, pela oração e pelo exercício da caridade, e ajudado pelas múltiplas formas de educação permanente da fé, procura tornar seu o desejo de Cristo: « Sede perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito ». (169) É o chamado à plenitude que se dirige a cada batizado.
57. O ministério da Palavra está a serviço deste processo de conversão plena. O primeiro anúncio tem a característica de chamar à fé; a catequese, a de dar um fundamento à conversão e uma estrutura de base à vida cristã; e a educação permanente à fé, na qual se distingue a homilia, a de ser o nutrimento constante do qual cada organismo adulto necessita para viver. (170)
Diversas situações sócio-religiosas diante da evangelização
58. A evangelização do mundo tem diante de si um panorama religioso muito diversificado e mutável, no qual se podem distinguir fundamentalmente « três situações » (171) que requerem respostas adequadas e diferenciadas.
a) A situação daqueles « povos, grupos humanos, contextos socioculturais onde Cristo e o seu Evangelho não são conhecidos, onde faltam comunidades cristãs suficientemente amadurecidas para poderem encarnar a fé no próprio ambiente e anunciá-la a outros grupos ». (172) Esta situação postula a « missão ad gentes » (173) com uma ação evangelizadora centrada, preferivelmente, nos jovens e adultos. A sua peculiaridade consiste no fato de que se dirige aos não cristãos, convidando-os à conversão. A catequese, nesta situação, desenvolve-se ordinariamente no interior do Catecumenato batismal.
b) Existem, além disso, situações nas quais, num determinado contexto sociocultural, estão presentes, de maneira muito significativa, « comunidades cristãs que possuem sólidas e adequadas estruturas eclesiais, são fermento de fé e de vida, irradiando o testemunho do Evangelho no seu ambiente, e sentindo o compromisso da missão universal ». (174) Estas comunidades necessitam de uma intensa « ação pastoral da Igreja », visto que são constituídas por pessoas e famílias com um profundo senso cristão. Em tal contexto, é necessário que a catequese às crianças, adolescentes e jovens desenvolva verdadeiros processos de iniciação cristã bem articulados, que lhes permitam aceder à idade adulta com uma fé madura que, de evangelizados, os transforme em evangelizadores. Mesmo nessas situações, os adultos são destinatários de modalidades diversas de formação cristã.
c) Em muitos países de tradição cristã e, às vezes, também nas Igrejas mais jovens, existe uma « situação intermédia », (175) onde « grupos inteiros de batizados perderam o sentido vivo da fé, não se reconhecendo já como membros da Igreja e conduzindo uma vida distante de Cristo e do Seu Evangelho ». (176) Esta situação requer uma « nova evangelização ». A sua peculiaridade consiste no fato de que a ação missionária se dirige aos batizados de todas as idades, que vivem num contexto religioso de referências cristãs, percebidos apenas exteriormente. Nesta situação, o primeiro anúncio e uma catequese de base constituem a opção prioritária.
Mútua conexão entre as ações evangelizadoras correspondentes a estas situações
59. Estas situações sócio-religiosas são, obviamente, diferentes e não é justo equipará-las. Tal diversidade, que sempre existiu na missão da Igreja, adquire hoje, neste mundo em constante transformação, uma novidade. De fato, com freqüência, diversas situações convivem num mesmo território. Em muitas cidades grandes, por exemplo, coexistem simultaneamente a situação que postula uma « missão ad gentes » e outra que requer uma « nova evangelização ». Junto a estas, estão dinamicamente presentes comunidades cristãs missionárias, alimentadas por uma adequada « ação pastoral ». Hoje ocorre freqüentemente que, no território de uma Igreja particular, seja preciso enfrentar o conjunto dessas situações. « Os confins entre o cuidado pastoral dos fiéis, a nova evangelização e a atividade missionária específica não são facilmente identificáveis, e não se deve pensar em criar entre esses âmbitos barreiras ou compartimentos estanques ». (177) De fato, « cada uma influi sobre a outra, estimula e a ajuda ». (178)
Por isso, em vista do mútuo enriquecimento das ações evangelizadoras que convivem juntas, convém levar em consideração que:
– A missão ad gentes, qualquer que seja a área ou âmbito em que se realiza, é a responsabilidade missionária mais específica que Jesus confiou à Sua Igreja e, portanto, é o modelo exemplar do conjunto da ação missionária da Igreja. A « nova evangelização » não pode suplantar ou substituir a « missão ad gentes », que continua a ser a atividade missionária específica e a tarefa primária. (179)
– « O modelo de toda catequese é o Catecumenato batismal , que é formação específica, mediante a qual o adulto convertido à fé é levado à confissão da fé batismal, durante a vigília pascal ». (180) Esta formação catecumenal deve inspirar as outras formas de catequese, nos seus objetivos e no seu dinamismo.
– « A catequese dos adultos, uma vez que é dirigida a pessoas capazes de uma adesão e de um empenho realmente responsáveis, deve ser considerada como a principal forma de catequese, para qual todas as demais, não por isso menos necessárias, estão orientadas ». (181) Isso implica que a catequese das demais idades deve tê-la como ponto de referência e deve articular-se com ela, num projeto catequético de pastoral diocesana, que seja coerente.
Desse modo, a catequese, situada no âmbito da missão evangelizadora da Igreja como « momento » essencial da mesma, recebe da evangelização, um dinamismo missionário que a fecunda interiormente e a configura na sua identidade. O ministério da catequese mostra-se, assim, como um serviço eclesial fundamental na realização do mandato missionário de Jesus.

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